No final da década de 1980 o Homem-aranha
vivia uma fase complicada. Os editores haviam decidido casar o personagem, o
que se revelara uma boa estratégia de marketing, pois trouxera mais leitores
para o título, mas parecia ser um problema editorial: o matrimônio se revelara
um complicador narrativo e parecia que não seria fácil escrever boas histórias
com um herói casado. Foi quando J M De Matteis criou uma das melhores histórias
do personagem, usando exatamente o casamento como mote narrativo.
A história surgira em 1984 quando De
Matteis apresentou à Marvel uma proposta de minissérie do personagem Magnum em
que ele era enterrado vivo por seu irmã, o Ceifador, e abre caminho até a
superfície para só então descobrir que estivera debaixo da terra por meses. O
editor-executivo da Marvel, Tom de Falco, recusou a ideia imediatamente.
Mas o roteirista sabia que ali havia uma
boa história e ofereceu a história como uma trama do Batman, para a DC Comics,
mas foi novamente recusado.
Quando em 1986 lhe ofereceram o título do
Homem-aranha, ele resolveu que aquela seria sua chance de ressuscitar a ideia
de um herói que é enterrado vivo. Na verdade, ele percebeu que aquele era o
personagem ideal para a trama: “Seu amor pela esposa, pela vida que estão
construindo juntos, foi o combustível emocional que moveu a trama. A presença
de Mary Jane alcançou as profundezas do coração e da alma de Peter, forçando-o
a sair daquele caixão”, declarou o roteirista.
A ideia inicial era criar um novo vilão,
mas quando De Matteis leu que Kraven era russo, percebeu que era o personagem
certo para a trama. Usando como inspiração Dostoievisky, o roteirista deu uma
profundidade ao caçador nunca imaginada. Nas histórias anteriores ele era
apenas um caçador que se dedicava a caçar o Homem-aranha. Na história de De
Matteis ele era um aristocrata russo, obcecado pela ideia de honra e oscilando
entre a selvageria e a civilização. Poucas vezes um vilão havia sido mostrado
de forma tão tridimensional. A sequência inicial, em que o personagem é
mostrado em suas três facetas (a fera, o nobre, o caçador) deu o tom da série e
mostrou que as historias do aracnídeo haviam chegado a outro patamar.
Para desenhar a história foi chamado Mike
Zeck, uma escolha perfeita para a história com seu traço elegante e poderoso.
A última caçada de Kraven era para ser
apenas mais uma das histórias da revista mensal do Homem-aranha, mas se tornou
um dos maiores clássicos do personagem, sendo republicada diversas vezes como
minissérie ou álbum de luxo.