Jefferson Nunes
Em 1990 a dupla Gian e Bené, deu um tempo de suas estórias
de terror para contar aquela que é sem duvida a melhor estória de super heróis
já produzida em solo brasileiro: A Insólita
Família Titã.
Influenciados pela leitura de Watchmen e principalmente de
Miracleman (ambas obras primas de Alan Morre), a dupla resolveu homenagear a
Família Marvel da DC Comics através de uma ótica inovadora e totalmente
inusitada.
Franco Rosa, Editor da Editora
Nova Sampa na época, pediu que a dupla fizesse uma história de 30 páginas um a
revista que ele estava lançando e só havia uma semana para realizar todo o
trabalho, do roteiro à arte-final.
Assim, Bennett e Gian se reuniram em um cômodo que eles chamavam de estúdio
situado na clínica de um tio do desenhista, que estava fechada. Então, eles
conversaram sobre as possíveis estórias e surgiu a idéia de fazer uma homenagem
à Família Marvel.
A estória foi elaborada naquele momento. À pedido de Franco, ela deveria conter
cenas de sexo, entretanto, para os autores, não havia como encaixar sexo na HQ.
Então, Bené ficou como responsável para adicionar esse tema. De fato, das 30
páginas, apenas duas contiveram cenas de sexo.
No mesmo dia, Benné fez o rafe da estória e Danton os balões. Em menos de uma
semana, o artista desenhou e arte-finalizou a Família Titã. Foi um recorde,
afinal, era um trabalho urgente.
O interessante foi que, como
tiveram pouco tempo para conversar sobre a HQ, cada um teve uma interpretação
diferente sobre ela. Para Gian, o personagem Tribuno era o herói, para Bené, o
vilão. Assim, enquanto o desenho mostrava o protagonista em uma cruzada de
vingança, o texto intimista justificava suas ações. Isso criou uma dupla
possibilidade de interpretação: alguns leitores entenderam o personagem como um
sanguinário, outros como um homem bem-intencionado.
Outra característica
interessante é que a história se passa, boa parte, numa favela da cidade
fictícia de Santa Helena e o herói Tribuno é, na verdade, um deficiente físico.
Embora fosse publicada em
revista lacrada com saco plástico, a história fez grande sucesso entre os fãs.
Chegou a ter quatro tiragens, vendendo um total de 120 mil exemplares, mais do
que a venda do Homem-aranha na época.
A história foi também a
responsável pela entrada de Bené no mercado de quadrinhos dos EUA. Ao vê-la, um
agente americano se convenceu de que ele seria um ótimo desenhista de
super-heróis. Atualmente, Bené assina como Joe Bennett e desenha as histórias
da Liga da Justiça.
A história da Família Titã
desenrola se durante um período de 15 anos e se passa em Santa Helena, uma
cidade fictícia. E em uma favela daquela cidade, viviam César – deficiente
físico acometido por leucemia, que fugia da realidade abusando da leitura de
livros achados no lixo e que idolatrava a antiga sociedade greco-romana; Paulo
e Melissa, garotos amantes. Todos órfãos com, aproximadamente, 14 anos, que
viviam de sobras de lixo e catando papel para reciclagem.
César amava Melissa, que amava Paulo. Esse triângulo, de fato, foi a fonte para
todos os eventos da trama. César, inadvertidamente, encontrou um artefato
alienígena que lhe garantiu toda e qualquer forma de poder. Por ser um trágico
humanitário, o jovem deficiente decidiu compartilhar sua descoberta com seus
amigos, que fizeram uso do disco e se tornaram os super-heróis Tribuno, Centurião
e Vésper.
E durante algum tempo, eles foram os heróis do planeta, salvando as pessoas de
ameaças e tragédias. Mas o clímax atinge quando todos passam a confrontar os
ideais, resultando em uma tragédia digna da civilização grega.
"Quando Hulk 2 foi lançado,
notei o entusiasmo do pessoal, dizendo que havia ficado legal o uso da Favela.
Poxa, é isso aí! Na época que eu e Bené produzimos a Família Titã, as pessoas
diziam que estória de super-herói não combinava com favela. Então, é necessário
a vinda dos gringos para mostrar que isso podia ser feito, sim. Mas, com
certeza, nós fomos os pioneiros", disse Danton.
"Sim, tragédia e realismo fazem a cabeça dos leitores de hoje e o
engraçado é que nós introduzimos isso há quase 20 anos", completou
Bennett.
Danton continua brincando que eles são Stan Lee e Jack Kirby, "dois caras
bem diferentes, mas que usam essas diferenças nas estórias".
"Tanto que Franco a publicou várias vezes [Risos]", concluiu o
artista.
Fora de catalogo, os
exemplares da Familia Titã são disputadíssima
entre os colecionadores de Hqs e e sempre lembrada por vários estudiosos do
quadrinhos nacionais como sinônimo de qualidade. Alem disso a dupla Gian e Bene
mostrou que e possível sim criar boas estórias de super heróis no Brasil, desde
que fuja das imitações baratas e da falta de originalidade que sempre
caracterizou e caracteriza o gênero no
nosso pais. Um possível remake da estória vem sendo preparado e devera sair
pela editora Quadrix aina este ano.
Apesar de seu roteirista Gian
Danton afirmar que “Esta não é uma
história de super-heróis”, Familia Tita e totalmente antenada com as
mudanças que o gênero estava passando
naquela virada de década. O ambiente sombrio, os personagens psicologicamente
profundos e o clima de niilismo eram típicos da cahamada “Era Sombria” dos
quadrinhos. A dupla despretensiosamente
coloca essa pequena obra prima em pe de igualdade com a revolução que mestres como Alan Moore, Grant Morrison e
Frank Miller imprimiam nas paginas dos
então cansados comics americanos.