sábado, outubro 18, 2025

Ágora, a história de Hipátia

 


Ágora é um filme de 2009, Alejandro Amenábar, sobre a filósofa Hipátia, uma das mentes mais brilhantes de sua época e que acabou morrendo nas mãos dos cristãos depois de ter sido torturada e humilhada por eles.          
A película permite uma reflexão sobre vários assuntos e torna-se, desde já, grande candidato a ser exibido em aulas de história e filosofia, à semelhança de O nome da Rosa. 
Além das questões filosóficas levantadas no filme (curioso ver os filósofos discutindo o sistema de Ptolomeu em que os planetas tinham uma órbita em torno da terra e uma outra órbita em torno de si mesmos), há as questões teológicas e históricas.
Os cristãos daquela época eram o equivalente hoje dos fanáticos islâmicos. A destruição da Biblioteca de Alexandria pelos cristãos foi um crime contra humanidade equivalente ou até maior que a destruição do World Trade Center. Em termos culturais, maior, pois muito do conhecimento acumulado à época se perdeu. Na cena, Amenábar simplesmente inverte a câmera para mostrar que o mundo virou de cabeça para baixo.
O mais triste é perceber que as lições de Ágora ainda não foram aprendidas.


Ps: Quem me apresentou esse filme foi um ex-amigo, que virou bolsonarista e hoje em dia diz que a Hipátia era comunista e que esse filme é marxismo cultural. Se a filósofa voltasse hoje em dia, tenho certeza de que ele seria um dos que ajudariam a matá-la, rasgando-a com conchas e chamando-a de comunista. 

Livro A árvore das ideias marca 35 anos de carreira de Gian Danton

 

 

Em 2024 o roteirista de quadrinhos Gian Danton completa 35 anos na área de quadrinhos. Para marcar a data, a editora Marca de Fantasia lança o livro e-book A árvore das ideais – memórias de um roteirista de quadrinhos.

O livro é uma junção de textos e quadrinhos autobiográficos e narra a trajetória do roteirista desde a infância até o momento atual, passando por sua parceria com Bené Nascimento, a criação do grupo Ponto de Fuga e até mesmo a produção literária. Também a atuação na área acadêmica é focada na obra, assim como a descoberta do diagnóstico de autismo.  

A obra traz, na parte visual, a colaboração de três dos principais parceiros de Gian Danton: Bené Nascimento (Joe Bennett) fez a ilustração da capa; Antonio Eder desenhou duas HQs e JJ Marreiro desenhou uma HQ e fez o design da capa. Edgar Franco, orientador de doutorado de Gian, assina o prefácio.

Entre as várias histórias contadas no livro estão os bastidores cômicos da criação da revista Manticore, o falso Gian Danton e o psicopata que fez com que o roteirista começasse a pesquisar sobre serial killers.

O livro tem 184 páginas e pode ser baixado gratuitamente no link https://www.marcadefantasia.com/livros/quiosque/a_arvore_das_ideias/a_arvore_das_ideias.htm.

Perry Rhodan 66 – Os escravos cósmicos

 

No número 66 da série Perry Rhodan, o planeta Fera Cinzenta já se tornara importante o bastante para se tornar uma narrativa pararela às histórias centradas nos protagonistas.

Nos números anteriores o leitor havia acompanhado como uma tentativa de assassinar Rhodan havia fracassado e como os integrantes dos dois grupos envolvidos tinham sido enviados para outro planeta e como uma revolta tinha feito com que a astronave caísse no planeta desconhecido apelidado de Fera Cinzenta. Duas facções haviam se estabelecido em torno de dois líderes: o despótico Hollander e o democrata Mullon. Uma vez neutralizada a ameaça de Hollander, surge uma nova ameaça: o planeta é invadido por alienígenas dispostos a transformar os colonos em escravos, fazendo com que eles plantem cereais em centenas de milhares de quilômetros.

A capa original alemã. 


Os invasores são chamados de peepsies e descritos dessa forma por Kurt Mahr, autor do volume: “Tinham pelo menos dois metros de comprimento e eram tão magros que não se compreendia como não quebravam ao meio quando andavam eretos. Não tinham cabelos na cabeça e a caixa craniana brilhava como se tivesse sido coberta de açúcar de confeiteiro. Os olhos pareciam muito grandes. O nariz era ossudo e abria-se de forma grotesca na metade inferior”.  

O livro gira todo em torno de uma situação de suspense: os terranos conseguirão se livrar do jugo dos peepsies sem que seja necessário o auxílio dos homens de Rhodan (uma nave terra foi enviada ao local para monitorar a colônia, mas só intervir em último caso)?

Mahr, que à essa altura já tinha se tornado um autor competente, consegue estabelecer uma narrativa interessante e verossímil, em que os métodos de resistência criado pelos humanos parecem óbvios e fazem todo o sentido considerando-se as fraquezas dos peepsies.

Uma curiosidade do volume é que este é, provavelmente, o primeiro da série em que se fala de pena de morte. É mencionado que ela foi proibida na Terra após a unifacação e alguns argumentam que voltar a aplicá-la seria um retorno à barbárie. Entretanto, ela é executada duas vezes. Nas duas Mahr evita descrições detalhadas. Não sabemos nem mesmo com que método a pena foi executada. 

Processos midiáticos e novos tipos de interação

  O interesse no estudo do processo de comunicação surge justamente no período em que, na maior parte do mundo, os meios de comunicação de massa afloraram. As análises passaram de uma visão autoritária, da mídia como toda poderosa, às propostas de meios interativos. Hoje, a linha de pesquisa em processos midiáticos abre a porta para possibilidade de ver todos os meios como interativos, inclusive aqueles que são vistos como de sentido único.

Durante muitos anos, a mídia foi vista como uma flecha, de sentido único e autoritário, a exemplo do que pregava a teoria hipodérmica. Essa visão de uma mídia toda poderosa influenciou muito a corrente apocalíptica, que via as novas mídias, tais como o cinema e o rádio, como estando a serviço do autoritarismo.
Uma tentativa de tirar das novas tecnologias esse caráter autoritário surge com as propostas de interação. Assim, se existem veículos de sentido único, existem também mídias que permite um feedeback ativo, a exemplo do MSN, do chat e do e-mail.
Esse  modelo dialogal de interação será criticado por José Luiz Braga. Para ele, todos os processos midiáticos permitem interação.
Sua proposta de interação não se prende apenas à possibilidade de resposta ao emissor por parte do receptor. Existe também a possibilidade de interação receptor-produto  e receptor-sociedade ou sociedade-produto.
Esse modelo quebra totalmente com a ideia hipodérmica de receptor passivo.
Uma das formas de interação pode ser configurada na apropriação. Se existem pessoas que recebem os produtos da mídia de forma passiva e a-crítica, existe aqueles que reconfiguram sua simbologia, numa atitude que lembra a música Geração Coca-cola, do Legião Urbana (Vamos cuspir de volta o lixo em cima de vocês). Utilizar um símbolo da mídia e reconfigurar seu significado, como a Coca-cola, é uma forma de interação. 
Mesmo quando não é uma crítica negativa, essa resignificação pode ser uma forma de apropriação. Em um texto eu meu blog, eu faço uma relação do seriado Terra  de Gigantes com paradigmas científicos, uma discussão que provavelmente não estava nos planos dos criadores do mesmo. O fato de não sabermos se os protagonistas diminuíram de tamanho e estão em um mundo de pessoas com estatura normal, ou se estão de fato numa terra de gigantes abre espaço para discutir a teoria da relatividade, a física quântica e o relativismo filosófico.
Formas mais elaboradas de interação podem ser encontradas nos fanfics, em que fãs interagem com a obra original, mostrando outras possibilidades de interpretação. O fanfic O portal das probabilidades, de minha autoria, por exemplo, introduz a teoria do caos no universo da série alemã de ficção científica Perry Rhodan.
Claro que essa possibilidade de interação com os MCM é tanto maior quanto maior for a capacidade crítica dos indivíduos. Daí a importância, levantada por Braga, da criação de um sistema crítico.
Quanto mais preparadas estiverem o indivíduo e a sociedade, melhor a sua capacidade de interação e menores as chances de manipulação ou de recepção ingênua (se está publicado, é porque é verdade). Setores organizados da sociedade podem ter importância fundamental nesse processo.
Exemplo recente dessa possibilidade de interação crítica aconteceu com a publicação de uma reportagem da Veja contrária à demarcação de terras indígenas (A farra da antropologia oportunista). Um antropólogo citado na matéria veio a público denunciar que a revista teria inventado uma entrevista com ele. A revista argumentou que a citação fora tirada de um dos livros do pesquisador. Este contra-argumentou que a citação fora deturpada para  servir aos interesses  da publicação.
O SBPC lançou uma nota pública de repúdio à Veja e de apoio ao antropólogo. No Twiter,  surgiu a tag #boicoteveja, que pretendia aglutinar casos semelhantes de manipulação. Blogs, num processo de apropriação, fizeram capas fictícias da Veja, denunciando o perfil manipulador das matérias da revista. Numa delas, por exemplo, aparecia Darth Vader com o título “Ele salvou você”. Na mesma capa, sob uma imagem do mestre Yoda, a legenda: “Descoberto o líder espiritual dos terroristas rebeldes”.

Direto da estante - coleção graphic novel

 

Graphic Novel foi uma coleção lançada pela editora Abril em 1988 para aproveitar o interesse por edições de luxo, voltadas para um público mais adulto. O conceito de graphic novel foi criado provavelmente por Will Eisner (há alguma controvérsia a respeito disso) para se referir a histórias com melhor qualidade artística e literária. No Brasil o interesse por esse tipo de edição começou com Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller.
No começo, a coleção se limitou a publicar histórias com super-heróis. Mas com o tempo começou a publicar material autoral norte-americano e até europeu. No geral, o nível era altíssimo. A coleção durou 29 números, terminando em julho de 1992.
O sucesso da coleção fez com que surgissem outras nesse mesmo formato, como a Graphic Marvel, da própria Abril, a Graphic Sampa, da Nova Sampa e a Graphic Glob, da editora Globo. 

Clarabela e o jornalismo

 

 

A primeira lição que eu tive sobre o jornalismo aconteceu muito antes de entrar na faculdade.
Eu era ainda uma criança quando li, numa revista Disney, uma história em que Clarabela era contratada como repórter. A situação era meio surreal, pois ela não era formada em jornalismo, não tinha experiência e nem mesmo pauta. O editor simplesmente mandou que ela fosse a campo em busca de notícias.
 A primeira matéria dela foi sobre coisas que aconteciam com ela: o que ela havia feito durante o dia, etc. Era até informação, mas que só interessava a ela e aos amigos. Quando o editor vê o texto, fica desesperado: "Não, a notícia não pode ser sobre você!".
E lá foi a Clarabela em busca de outra notícia...
Nisso ela passa na frente do banco e acaba sendo tomada como refém.
Apesar do assalto ter  sido algo que atiçara a curiosidade de todos, Clarabela não escreve a notícia, pois o fato havia acontecido com ela e o editor havia dito que ela não era notícia.
O leitor, esperto, descobria que ambos, editor e repórter eram verdadeiras antas e que notícia é informação, mas um tipo específico de informação: a que tem interesse público. O cotidiano de Clarabela não tem interesse público, mas o assalto ao banco tem. 
Jornalismo trabalha com informação de interesse público. Simples, não?

Demolidor – Trilhas de papel

 


Durante sua passagem pelo Demolidor, Frank Miller conseguia equilibrar perfeitamente ação desenfreada, trama policial, trama política e humor. Bom exemplo disso é a história trilhas de papel publicada em Daredevil 178.

Na história, um vereador, Randolph Cherryh, tem a sua campanha financiada pelo Rei do crime, que pretende usar o expediente para chegar ao poder político.

As sequências com Luke Cage e Punhos de Ferro são humorísticas desde o início. 


O Clarin Diário denunciou o esquema e contratou o escritório de Nelson & Murdock para denfendê-lo, o que coloca o Demolidor diretamente no centro dos acontecimentos. Um rapaz tem uma cópia de um cheque que comprovaria a ligação entre o candidato e o mafioso e todos estão atrás dele, incluindo Tucão e Mongol e o Demolidor.

Acontece que, temendo pelo sócio, Nelson Foggy contrata Punho de Ferro e Luke Cage para protegerem Matt Murdock.

O Demolidor faz os outros dois heróis de bobos. 


Eu lembro quando li essa história pela primeira vez, o quanto ri das situações criadas por Miller com os dois heróis sendo enganados por Matt Murdock para que ele possa se disfarçar de Demolidor e encontrar o garoto com o cheque. Na época, era algo totalmente inédito mostrar heróis em situações ridículas e é exatamente o que acontece aqui.

Ação: Elektra é testada pelos capangas do Rei. 


Em uma narrativa paralela mais séria, Elektra é contratada pelo Rei do crime como sua assassina particular – e isso é feito em várias sequências de ação, incluindo uma surra em capangas do mafioso em um teste de suas habilidades.

Miller estava construindo meticulosamente o grande drama que colocaria Matt Murdock em rota de colisão com a mulher que ele mais amava.

A arte espacial de Jim Burns

 


 
O britânico Jim Burns é um dos mais aclamados artistas de ficção científica e fantasia. 

Ele começou sua carreira como piloto da RAF, mas vendo que ser piloto não era seu futuro resolveu investir no ramo da arte. Ele cursou a St. Martin's School of Art, em Londres e foi quando estava nessa escola que ele consegiu seu primeiro trabalho em, 1972. 

Burns logo se tornou um requisitado capista de livros de ficção científica e fantasia, o que lhe rendeu 3 Hugos e 14 prêmios BSFA. 

Ele também trabalhou em filmes célebres, como o primeiro Blade Runner. 

Atualmente ele se afastou do mundo editorial e tem se dedicado a produzir quadros sob encomenda.  












sexta-feira, outubro 17, 2025

Uma noite em 67

 


Em 1967 a TV Record exibiu o 3º Festival da Música Popular Brasileira. Poderia ser apenas mais um festival de música, mas se tornou um marco na carreira dos artistas e uma quebra de paradigmas.

Foi essa edição revolucionária do festival que Renato Terra e Ricardo Calil transfomaram no documentário Uma noite em 67.

Com imagens da época e depoimentos de pessoas envolvidas – do diretor da TV Record a artistas como Roberto Carlos, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Chico Buarque, o documentário busca recriar o clima do festival, colocando o expectador no centro dos acontecimentos.

Foi em 1967, no festival, que surgiu a Tropicália, mais especificamente com Domingo no Parque, de Gilberto Gil e Os mutantes e Alegria, alegria, de Caetano Veloso. Era um movimento tão inovador e irreverente que faria com que Chico Buarque, com apenas 23 anos, parecesse um conservador ultrapassado.

O documentário perspassa acontecimentos externos ao festival, como a passeata contra a guitarra, mas que tiveram um impacto direto no evento.

Talvez o momento mais interessante sejam as apresentações de Caetano e de Gil, inicialmente muito vaiadas pela plateia, e a forma como, com seu talento, eles foram conquistando o público até o final apoteótico em que foram aplaudidos de pé. É uma rica demonstração de como a arte pode vencer o preconceito. Também vale muito a pena ver as entrevistas de bastidores em que, por exemplo Gilberto Gil defende a inclusão do pop na arte, chegando a citar as histórias em quadrinhos.

No final, grande ganhadora do festival foi Ponteio, de Edu Lobo, uma música, hoje em dia considerada conservadora. Gil ficou em segundo e Chico em terceiro, com Roda Viva. Apesar de não terem ganhado o festival, Gil e Caetano escreveram seu nome na música popular brasileira e mudaram os rumos dessa mesma música.

Uma noite em 1967 é um daqueles documentários obrigatórios para quem gosta de boa música. Está disponível na Netflix.

Legião Alien – um dia para morrer

 


A Legião Alien era uma das séries preferidas pelos leitores da saudosa revista Epic Marvel. A ideia de uma legião de soldados das mais variadas raças realizando missões impossíveis no espaço dividia espaço com ótima caracterizações de personagens, roteiro bem amarrado e desenhos e diagramação inovadores.  Todas essas qualidades podem ser observadas na história Um dia para morrer, publicada no número 15 da coleção Graphic Novel, da Abril.

A história começa com um instrutor contando a recrutas sobre a glórias da Legião e seu mais famoso representante, o Capitão Vektor, que, encurralado por milhares de inimigos, enfrentou-os bravamente com apenas quatro homens. Dele restou apenas o braço mecânico, mantido como relíquia no museu da Legião.

A história começa com um instrutor falando sobre as glórias da Legião. 


Em seguida, a narrativa pula para o Capitão Sarigar, que recebe a missão de assassinar o líder dos tecnóides (um grupo de pessoas que abdica de seus corpos de carne para se tornarem androides), intalar o caos na capital tecnóide e colocar no lugar um governo favorável à Galarquia.

E o grupo que executará essa missão não poderia ser mais disfuncional: um só pensa em lucros, o outro está amargurado por ter sido abandonado pela noiva, o outro entra numa crise de consciência por ter de organizar um assassinato a sangue frio. Cada um deles muito bem representado tanto visualmente, com seus corpos alienígenas, quando psicologicamente.

O grupo de voluntários é muito diverso. 


E a trama é muito bem bolada, com um enredo que ecoa diretamente a famosa frase do filme O homem que matou o fascínora: “Quando a lenda é mais fascinante que a realidade, publique-se a lenda”.

Os judeus nos filmes nazistas

 


Os judeus eram as vítimas preferenciais da propaganda nazista. O objetivo dos filmes da época eram mostrar que eles eram desumanos e sua convivência com outros povos intolerável.
Todos deveriam odiar os judeus e aqueles que não achassem suficientes as explicações para tal ódio deveriam se sentir culpados. Os principais filmes a seguir esse raciocínio foram produzidos justamente na época em que se planejava a solução final.
O Rothschilds mostra como os judeus fizeram fortuna na época das guerras napoleônicas, enquanto o povo ficava na miséria. A figura do judeu por si só devia causar repulsa: tem mãos aduncas, rosto encarniçado, olhar sádico e vivia sempre às custas dos outros.
O Judeu eterno, de Hippler, um soldado da SS, não economiza nas tintas. Quando fala da sujeira dos judeus, aparecem moscas na tela. Quando se refere à forma como os judeus se espalharam pela Europa, mostra ratos andando por um mapa. Quando diz que os judeus são preguiçosos e só trabalham sobre pressão, mostra judeus descansando apoiados em pás.
Mas a obra-prima do cinema anti-semita é O judeu Suss, de Veit Harlan. Realizado com apuro técnico, bom roteiro e direção, o filme evitou a pecha de anti-semita por desejar ser visto como um filme histórico. No entanto, a película deturpa completamente a figura histórica de Süss Oppenheimer (1692-1738), conselheiro do duque Carlos Alexandre.
Na história real, Suss é preso após a morte do duque pelas corporações que haviam perdido poder durante a gestão de Carlos Alexandre.
Mas no filme de Harlan essa trama é escondia. Suss é simplesmente um judeu pérfido, que explora o povo e quer copular com a heroina loira, jovem e ariana.
Todas as cenas em que aparecem os judeus são sombrias, como se eles só agissem nas sombras. Quando ele é enforcado em praça pública e os judeus expulsos da cidade, o céu se abre e cai neve, como que limpando a sujeira e tomando de branco a cena. De fundo, uma música religiosa de rendenção.
O protagonista principal foi Ferdinand Marian, no papel de judeu sombrio e traiçoeiro, que representava um perigo físico e moral para a sociedade alemã, segundo a ideologia nazista. O papel feminino de destaque foi assumido por Kristina Söderbaum, a esposa de Harlan, que incorporava como nenhuma outra as supostas características da mulher ariana: loura, olhos azuis e raça nórdica.
O filme era considerado tão importante por Goebbels que seu diretor recebeu recursos ilimitados. Pôde até escolher figurantes judeus nos guetos.
O filme fez sucesso extraordinário. Não bastassem isso, ele era assistido obrigatoriamente por todos os soldados alemães nos campos de concentração, preparando os soldados para o extermínio de judeus.
Seu diretor chegou a ser processado no pós-guerra, acusado de crime contra a humanidade. Seu filme foi proibido, mas ele conseguiu ser absolvido com o argumento de o filme tinha sido desfigurado por Goebbels.

Juba & Lula – Operação Super-homem

 

Na década de 1980  o seriado Armação Ilimitada se tornou o grande azarão da TV. A ideia tinha sido de dois atores surfistas, Kadu Moliterno e André De Biase ao qual se juntou Andréa Beltrão. Os roteiros eram non-sense e a direção de Guell Arraes garantia uma boa dose de metalinguagem e humor.

Essa mistureba fez tanto sucesso que levou a editora Nova Fronteira a lançar uma versão em quadrinhos dos personagens Juba e Lula. Para desenhar escolheram o argentino Héctor Gomes Alísio e para o roteiro o  desconhecido Régis Rocha Moreira.

O roteirista exagerava nos textos, fazendo com que o desenho ficasse apertado entre os balões. 

A história Operação Super-homem mostra a dupla lutando contra um nazista que pretende criar um super-homem. E qual seria o objetivo de um nazista ao criar uma pessoa extremamente forte? Montar um exército e reviver o III Reich? Não, transformar o soro numa droga e vender nas ruas. Era para ser non-sense, mas é simplesmente algo que não faz sentido, assim como quase tudo nessa história.

Logo no início, os protagonistas estão chegando na praia quando quase batem em um carro que está saindo do estacionamento. Algo relacionado à trama? Não. Apenas uma desculpa para eles conhecerem duas garotas... que aparecem apenas em um quadrinho! A situação, que parece ser apenas uma piada solta, sequer é desenvolvida. Aliás, por esse único quadro fica evidente que Héctor é um excelente desenhista de mulheres. Mas o roteirista simplesmente não aproveita isso: 90% das cenas tem apenas homens.

A história cria toda uma situação para uma paquera que só dura um quadro. 

Junte a isso piadas que não funcionam, diálogos expositivos (os famosos bifes) enormes e um final abrupto, que parece indicar que o roteirista só pensou no final da história na última página.

Ao final das contas, Jula e Lula Operação super-homem acaba sendo uma curiosidade quadrinistica dos anos 1980, que vale apenas pelo desenho.

Fundo do baú - Speed Racer

 

Speed Racer é um anime dos anos 60, criado por Tatsuo Yoshida sobre corridas de automóveis. Speed Racer (nome dado pela dublagem brasileira, o nome original é Go Mifune), um jovem e audaz piloto de corrida de dezoito anos, dirige o carro Mach 5 criado por seu pai (Pops) e vive diversas aventuras dentro e fora das pistas.
 Um produto típico dos anos 60, usa um topete de Elvis Presley e suas maiores aventuras lembram os filmes de 007.
O desenho é muito conhecido pela sua canção tema e pela ótima trilha sonora. Como seus mais célebres competidores, temos a "Equipe Acrobática" e o "Carro Mamute". As corridas eram em locais inusitados, como selvas, desertos e até dentro de um vulcão.
O Mach 5, carro de corrida de Speed, tinha um arsenal de equipamentos que ajudavam Speed a se safar das enrascadas em cada uma de suas aventuras. Um dos equipamentos permitia que o carro praticamente pulasse sobre os obstáculos. 

Bran Mak Morn - O último rei dos pictos

 


Hoje em dia pode não parecer, mas o gênero espada e magia teve sua origem na junção, feita por Robert e Howard, das histórias de capa e espada e fantasia com as histórias de terror. 

Essa herança do terror pode ser apenas percebida nas histórias de Conan, mas aparece quase como elemento principal nas histórias de Bran Mak Morn, como nos mostra a coletânea lançada pela pipoca e nanquim em 2021.

O volume, de 364 páginas, reúne todas as histórias de Robert E. Howard com os pictos publicadas em revistas pulps, além de textos inéditos ou inacabados, como uma peça de teatro e poemas.

Howard trocava cartas com Lovecraft e, em uma delas, admite que tinha um verdadeiro fascínio pelos pictos: “Para mim, ‘picto’ sempre vai se referir aos pequenos e escuros aborígenes da Britânia vindos do mediterrâneo”.

A primeira vez que eles aparecem em uma história publicada é no conto A raça perdida, impresso na revista Weird Tales, de janeiro de 1927. Na história, um bretão chamado Cororuc salva um urso do ataque de uma pantera. Pouco depois, é preso por pequenos homens que o levam para uma cidade debaixo da terra e o condenam à morte. Howard depois iria mudar sua versão a respeito dos pictos, mas reaproveitaria o conceito de homens vivendo no subterrâneo em Vermes da Terra.

Lovecraft foi a grande influência para a criação do gênero espada e magia.


A primeira aparição de Bran vai acontecer em Weird Tales de novembro de 1930. Na história, o rei dos pictos está se preparando para enfrentar os romanos, criando para eles uma armadilha, mas para o plano funcionar, precisa da ajuda dos nórdicos, mas estes pensam em passar para o lado dos romanos depois que seu rei foi morto em batalha. Só seguirão Bran se este conseguir um rei que eles respeitem e que os lidere em batalha. O feiticeiro Gonar, faz surgir das trevas o rei Kull e descobrimos que Bran Mak Mor é descendente do lanceiro Brule, melhor amigo do rei de Valúsia.

Além de dar uma linhagem mítica para Bran Mak Mor, Howard também muda a origem dos pictos: agora eles eram habitantes de uma nação no oceano ocidental aliada da Valúsia.

O conto se destaca pelas descrições vívidas da batalha, uma especialidade do escritor e pelo ótimo final.

A forte influência de Lovecrat e das histórias de terror vai se revelar principalmente na história Filhos da noite, publicada em Weird Tales em maio de 1931. Na história, um grupo de estudiosos de civilizações antigas conversa e manipula objetos antigos quando um deles é atingido e volta ao passado, encarnando em um habitante da Inglaterra na Idade Média cujo grupo foi atacado por um povo reptiliano que vivia sob a terra e que tinham sido expulsos da superfície pelos pictos. Ao acordar e ver seus companheiros mortos, ele passa a perseguir os pequenos guerreiros, exterminando-os.

O livro conta com ilustrações de Gary Gianni. 


Na primeira parte, em que os estudiosos conversam, a influência de Lovecraft é declarada. Um dos pesquisadores, ao listar livros importantes de terror coloca O Chamado de Cthulhu, de Lovecraft como um dos três melhores de todos os tempos. Detalhe: naquela época essa história não tinha sido publicada na forma de livro. Na época Lovrecraft era um desconhecido que publicava apenas em revistas Pulp, o que mostra a fascinação que Howard tinha pelo seu mentor. A história também é repleta de referências a personagens ou detalhes da obra de Lovecraft, incluindo o fato de que um dos personagens tinha lido o Necronomicon na versão grega.

O problema de Os filhos da noite é que esse é também o texto em que Howard incorpora não só os elementos de terror de Lovecraft, mas também seu racismo. O personagem principal, o narrador diz que é um ariano: “Minha linhagem é nobre, apesar de hoje estar degradada e caindo em decadência por conta da contínua miscigenação com raças conquistadas”.

Baseando-se em teorias totalmente equivocadas, Lovecraft acreditava que a miscigenação levava à degeneração das raças, o que para ele era o grande terror (hoje sabe-se que a miscigenação é uma grande vantagem evolutiva). O protagonista inclusive tenta matar um outro pesquisador, que ele acredita ser descendente do povo reptiliano e sobre até mesmo para chineses e mongóis, mostrados por ele com descentes dos vilões da história.    

A quarta história, O homem das trevas, trata de um celta renegado pela própria tribo que tenta sua redenção salvando uma moça sequestrada por vikings. No caminho ele encontra uma estátua de um Bran Mak Mor e a leva no barco, de modo que a estátua acaba protegendo-o.

O homem das trevas mostra Howard no seu melhor momento, com vívidas descrições de batalha e momentos inspirados, como em: “Aqueles que se deleitava ao lado da fogueira do lado de fora continuavam a cantar, ignorando as silenciosas espirais da morte acercando-os”.

Mas o melhor conto da obra, em que Howard consegue unir com perfeição terror e fantasia, é Vermes da Terra, publicado em Weird Tales de novembro de 1932.

Na história, Bran Mak Morn, depois de ver um picto sendo crucificado pelos romanos, decide buscar a ajuda do povo reptiliano para vencer o inimigo. Para conseguir entrar em contato com esses seres deformados que vivem nas entranhas da terra, ele procura uma feiticeira. “Não era velha, mas a sabedoria maligna das eras habitava seus olhos. Suas parcas vestes eram esfarrapadas e suas madeixas emaranhadas e despenteadas, o que lhe emprestava um aspecto de selvageria condizente com aquele ambiente soturno”, descreve Howard, num texto que evoca diretamente as histórias de terror.

Vermes da Terra foi adaptada para os quadrinhos por Roy Thomas, Tim Conrad e Barry Windsor-Smith.


A feiticeira, em troca de uma noite de amor, aceita ajudar o rei dos pictos e lhe indica onde se encontra a esfera que os vermes da terra idolatram e que será o objeto de barganha para que eles levem até Bran o comandante dos romanos.

A história é repleta de referências ao universo de Lovecraft, incluindo o pântano de Dagon, onde a feiticeira vive e até os deuses sinistros de R´lyeh.

Além disso, ao invés de centrar a narrativa em batalhas, Howard foca toda ela no horror da jornada de Bran, incluindo sua descida ao submundo e a um lago habitado por um monstro. Era uma história de terror mascarada de história de capa de espada (inclusive com um final que evoca diretamente o gênero terror), tanto que Lovecraft celebrou: “Poucos leitores, um dia esquecerão o poder atraente e hediondo dessa obra-prima macabra, Vermes da Terra”. Lovecraft estava certo. Mesmo que todo resto fosse ruim, só esse conto já valeria todo o volume.

Em tempo: Vermes da terra foi adaptado para os quadrinhos por Roy Thomas, Tim Conrad e Barry Windsor-Smith. No Brasil essa história foi publicada nos números 27 e 28 de A espada selvagem de Conan.