sexta-feira, setembro 30, 2022

Coleção DC 75 anos – a era de prata

 

 


Em 2010 a DC Comics completou 75 anos. Para comemorar, a Panini lançou no Brasil uma coleção em quatro volumes, cada um reunindo histórias de um período: Era de Ouro, Era de Prata, Era de Bronze, Era Moderna.
Há uma polêmica sobre como teria começado a Era de Prata, mas a maioria dos autores concorda que foi com o ressurgimento dos super-heróis devido ao sucesso da nova versão do Flash, em Showcase 4, de 1956. A partir daí a DC voltou a investir em heróis de malha e as revistas começaram a pipocar nas bancas, até culminar na reunião dos heróis na Liga da Justiça.
A revista que deu origem à era de prata dos super-heróis. 


O volume pretende dar uma visão geral do período e, como não poderia deixar de ser, inicia com o ressurgimento do Flash, com roteiro de Robert Kanigher, desenhos de Carmine Infantino e arte-final de Joe Kubert. Dá para perceber porque se tornou um clássico que salvou os heróis do esquecimento: o roteiro é bem amarrado, com uma sacada genial  e irônica (um velocista enfrentando o Tartaruga, o homem mais lento da terra) e os desenhos são lindos, a começar pela splash page inicial com o Flash avançado pela página como se estivesse escapando dos quadrinhos. E, comparado com a versão do personagem da Era de Ouro, essa é muito mais consistente.
A história a seguir, do Superboy, é outro clássico típico da era de ouro. Escrita por Otto Binder e desenhada por Al Plastino, a HQ apresenta a Legião dos Super-heróis. Ainda na coleira do Comics Code, os quadrinhos não poderiam ter nada que parecesse ofensivo aos pais. Então esqueça violência ou conflitos familiares. Os roteiristas tinham se adequar a plots ingênuos e fazer com que eles parecessem interessantes. É o que fazem os autores dessa história. Na HQ, o Superboy tenta ser admitido na Legião, mas falha em todos os testes, pois sempre aparece algo mais urgente para ser resolvido. O plot twist final é ingênuo, mas eficaz dentro da lógica da época.


A origem do Aquaman (com roteiro de Robert Bernstein e desenhos de Ramona Fradon) deixa um ar de incômodo nos leitores mais costumazes. É parecida demais com a origem de Namor. Ambos são filhos de mulheres atlântidas com humanos, só para dar um exemplo. Mas como na época o Príncipe dos Mares não era publicado e a Marvel dependia da DC para a distribuição de suas revistas, isso acabou não dando origem a um óbvio processo judicial por plágio.
Segue-se a famosa história em que o Flash da era de prata encontra o da era de ouro. Famosa por que deu origem ao conceito de que existem vários universos DC em dimensões diferentes, e a história em que a Liga da Justiça encontra a Sociedade da Justiça, aproveitando esse mote.
A história que deu origem ao multiverso DC. 


Depois uma história dos parceiros mirins dos heróis em que Robin, Kid Flash e Aquakid precisam solucionar o mistério do desaparecimento dos jovens de uma cidade do interior dos EUA. É irritante o quanto a HQ consegue ser unidimensional em seu conflito. Adultos não conseguem entender os jovens na cidade e os jovens não conseguem entender os adultos. Entre os heróis, os heróis adultos não conseguem entender suas versões mirins e estes, por sua vez, não conseguem entender os heróis. Mas no final, a solução é simplista. Diante de toda a complexidade de relacionamento que teríamos nos Novos Titãs na fase de Marv Wolfman e George Peres, histórias como essa parecem terrivelmente simplistas.
O volume traz ainda “A montanha do julgamento”, de Jack Kirby – e, independente da qualidade desse material, fico na dúvida se poderia entrar em um volume sobre a era de prata.
Algumas faltas são nítidas na edição. Não há, por exemplo, nenhuma história do Super-homem desenhada por Curt Swan, o desenhista mais emblemático da Era de Prata na DC. Além disso, não há nenhuma HQ do Gavião Negro de Joe Kubert, um dos melhores quadrinhos do período na DC.

Fundo do baú – National Kid

 


National Kid foi, provavelmente o primeiro super-herói garoto-propaganda. Criado em 1960, o personagem foi uma encomenda da National (atual Panassonic), que pretendia divulgar a marca e aumentar as vendas.

O seriado foi produzido pela Toei Company e teve apenas uma temporada com 39 episódios.

National Kid era um alienígena do planeta Andromeda que vivia na Terra como professor-cientista Massao Hata. Quando jatos abatem um disco voador no qual estavam incas venusianos, o herói percebe o perigo e resolve intervir para salvar a humanidade. Os incas haviam identificado que a humanidade criara a energia nuclear e resolveram invadir o planeta antes que os terrestres efetuassem viagens espaciais.

Com um grande N estampado no peito, o personagem salvava o dia usando apetrechos com uma pistola futurista, que era, na verdade, uma lanterna, e se comunicava através de um radinho de pilha transformado em comunicador. Todos produtos da National, claro.

Os principais vilões eram os incas venusianos, mas ao longo da série surgiram outros, como os seres abissais, que se locomoviam a bordo de um submarino monstruoso que, ao mover suas barbatanas, provocava terremotos.

A abertura da série mostrava o personagem voando com a sua pose característica, com as os braços abertos (uma pose escolhida, provavelmente, por causa do efeito da capa esvoaçante) enquanto um locutor dizia: “Mais rápido que os aviões a jato, mais forte que o aço! Super herói invencível, cavaleiro da paz e da justiça.... National Kid!”.

O seriado fez um sucesso estrondoso no Brasil desde que estreou em 1965, na TV Record. Curiosamente, em nenhum outro país esse sucesso se repetiu. Até mesmo no seu país de origem, o Japão, o herói só teve popularidade mediana.

Blog: um diário intelectual

 

Desde os 17 anos eu mantive um diário. Na época eu estava estudando para o vestibular e o diário servia como uma espécie de válvula de escape no meio de tanto stress e estudos. Mas, ao contrário da maioria das pessoas que eu conhecia e que mantinham um diário, eu raramente anotava fatos do dia. A maioria dos textos eram sobre minhas leituras, os filmes que eu assistia, exposições que eu visitava, etc, além de ensaios de contos, crônicas e até roteiros de cinema. Tinha também uma relação dos livros que eu pegava na biblioteca. Relendo, descubro que lia, religiosamente, um livro por semana.
Relendo-o, descubro que no dia 21 de setembro de 1988, visitei a exposição Langsdorff. Fiquei tão fascinado com a história que consegui, no jornal local, uma reprodução de um desenho de Florence e grudei no diário, com a referência de que ele fizera parte da expedição. No mês seguinte, assisti Feliz Ano Velho, filme de Roberto Gervitz baseado no livro de Marcelo Rubens Paiva. Além de imagens de filmes e livros e até desenhos, muitas vezes eu registrava curtas resenhas sobre as obras com as quais tinha contato.
Folhear o diário é um pouco como visitar o meu blog. Sem querer, ao criar o Ideias de Jeca-tatu, eu reproduzi o que já fazia no meu diário. Criado em 2003, numa época em que a maioria dos blogs era composto de fofocas que só interessavam aos autores e a um pequeno grupo de pessoas, esse era um blog diferente.
Ideias de Jeca-tatu era o nome do fanzine que produzi durante toda a década de 1990 e que, em muitos sentidos, substituiu o diário. O título era uma referência a um dos mais importantes livros de Monteiro Lobato, no qual ele registrava suas ideias sobre a arte e literatura do Brasil no início do século. “O Jeca-tatu não pensa, escreveu Lobato. Mas se pensasse, suas ideias seriam assim”.

X-men – O destino da Fênix

 


No número 135 The Uncanny X-men, a Fênix Negra era mostrada destruindo um Sistema estelar inteiro, como consequência matando bilhões de pessoas. No número 137, John Byrne e Chris Claremont (aparentemente a ideia era de Byrne) pretendiam fechar a saga com Jean Grey perdendo os poderes e se tornando uma pessoa normal.

Jim Shooter viu o que ia ser publicado e ficou indignado. A personagem tinha matado bilhões de pessoas e no final, tudo que acontecia era perder seus poderes. Ele exigia algum tipo de punição. Claremont e Byrne concordaram que o melhor a fazer seria matá-la.

O resultado foi uma das histórias mais célebres dos X-men de todos os tempos e um verdadeiro evento. A Marvel já tinha mostrado personagens importantes morrendo, como a namorada do Homem-aranha, Gwen Stacy. Mas matar uma heroína, e no auge da popularidade? Era algo totalmente inédito.

A morte da personagem é um dos momentos mais dramáticos dos quadrinhos. 


O interessante do encadernado da Panini com a saga é que possível comparar a versão que foi impressa com aquela que tinha sido produzida anteriormente. E o resultado da primeira versão era pífio, muito abaixo de todo o restante da saga da Fênix. Técnicos do império Shiar fazem uma espécie de operação em Jean Grey, tirando dela todo o seu poder, sob protetos de Wolverine e de Cíclope, como se ela estivesse passando por uma grande punição. Era um final totalmente artificial e forçado, considerando-se que todos ali sabiam que ela tinha matado bilhões de pessoas.

Já, ao contrário, o final que foi publicado, tem uma carga dramática impressionante. O império Shiar leva os X-men para a Lua, onde eles são derrotados pela Guarda imperial de Shiar. O trauma de ver Scott tombando faz com que Jean se transforme novamente na Fênix. Para o professor Xavier, a única solução é que os X-men a matem. Mas no final é ela que comete suicídio ao perceber que não poderá controlar a entidade e não poderá se perdoar caso provoque novas mortes. A cena em que ela se suicida, jurando amor ao Cíclope é uma das mais marcantes dos quadrinhos.

Na versão defendida por Byrne, bastava tirar a Fênix de Jean Grey. 


Dessa vez, Jim Shooter tinha toda razão.

PS1 : A saga da Fênix foi um final épico e surpreendente para o que na verdade era uma tentativa de resolver um problema de roteiro. A Fênix se tornara poderosa demais para os X-men, a ponto de torna-los inúteis. De que adiatavam as habilidades acrobáticas de Noturno diante de alguém que podia simplesmente moldar a realidade? O tempo todo Claremont tinha que inventar uma desculpa para que a personagem não pudesse usar totalmente seus poderes. Finalmente, resolveram tirá-la da equipe... e, no processo, criaram uma saga inesquecível.   

PS2: Um texto ao final do volume da Panini apresenta uma conversa entre os principais envolvidos na saga da Fênix. Nesse texto é possível perceber que Chris Claremont tinha uma visão muito mais aprofundada da história. Para John Byrne, apenas ocorrera uma espécie de possessão, com Jean Grey sendo dominada por algo totalmente exterior, que a controlava. Na visão de Byrne, bastava tirar essa entidade e Jean poderia voltar à normalidade como a garota feliz que era (ou seja, o final que não foi impresso era a ideia de Byrne). Para Claremont, a Fênix apenas despertou o lado sombrio da heroína, o que gerou todo o drama da história e elevou a saga da Fênix a um nível poucas vezes alcançado nos quadrinhos de super-heróis.

Portal Égua mano destaca trabalho de Gian Danton

 



O portal paraense Égua mano fez uma matéria dando destaque para meu trabalho com quadrinhos e literatura e fazendo uma retrospectiva de alguns dos meus trabalhos mais famosos na área de quadrinhos. Para conferir, clique aqui

X-men contra a Irmandade de Mutantes

 

A Feiticeira Escarlate aparece de verde na capa. 


A Irmandande de Mutantes, um grupo liderado por Magneto que tem como objetivo conquistar a humanidade, surgiu no número quatro da revista X-men.

Hoje em dia essa edição parece muito curiosa, a começar pela capa, na qual a Feiticeira Escarlate aparece de... verde! Sim, o colorista errou a cor do uniforme da moça e ninguém na redação percebeu. E estamos falando de uma personagem cuja cor é tão importante que aparece até no nome. Outro aspecto curioso é o fato de tanto a Feiticeira quanto Mercúrio aparecerem como vilões nessa história, eles que depois se tornariam heróis e fariam parte dos Vingadores.

O Homem de Gelo parecia um boneco de neve. 


A história começa com os X-men treinando na Sala do Perigo. Mais uma curiosidade: O Homem de Gelo parece ter o corpo formado por neve, e não gelo, e usa botas! O resultado é ridículo como se fosse um boneco de neve feito por uma criança. Essa sequência termina com um bolo, que a Garota Marvel tira da caixa com seus dons telecinéticos e Cíclope corta com os raios saídos de seus olhos.

Se o clima entre os X-men é de confraternização, na Irmandade de Mutantes é de conflito aberto. Mercúrio reclama que Groxo se comporta na mesa como um porco e o Mestre Mental assedia a Feiticeira.

Os X-men confraternizam. A Irmandade dos Mutantes briga. 


Mas, apesar das brigas, o grupo tem um plano: conquistar a pequena república de Santo Marco. Para isso eles usam um navio roubado por Magneto e as ilusões do Mestre Mental, que faz aparecer diante dos assustados nativos um exército com milhares de homens. Há aqui, um outro aspecto que hoje parece extremamente incoerente: o exército invasor usa uniformes parecidos com os de nazistas, com a suástica substituída por um M de Magneto. Se lembrarmos que Chris Claremont iria estabelecer Magneto como um judeu, vítima de nazistas na II Guerra, essa sequência é muito estranha.

Os soldados de Magneto usavam uniforme nazista. 


Claro que os X-men aparecem para acabar com a festa e aqui temos mais um problema. À certa altura o Fera coloca fora de combate dois soldados de Magneto, mas é derrubado por Groxo, ficando pendurado nas paredes so castelo. Para tentar se livrar do atacante, o Fera joga pedras nele, mas Stan Lee parece não ter entendido a imagem, em especial as linhas cinéticas, e escreve os diálogos como se o oposto estivesse acontecendo: “Ele é muito forte! Vou jogar essas pedras para evitar que ele suba até o topo!”.

Groxo está desviando das pedras, mas o texto dá a entender que ele está jogando as pedras no Fera.


Parece que naqueles primeiros números dos mutantes ninguém parecia saber exatamente o que estava fazendo.

quinta-feira, setembro 29, 2022

Abapuru e Monteiro Lobato

 

Ano passado um dos assuntos foi o quadro Abapuru. Alguém sugeriu que o quadro "Batalha do Avaí", de Pedro Américo (1843-1905), "deveria representar a arte brasileira no mundo" e chamava o quadro de Tarsila de merda. Os fãs de Tarsila correram para defendê-la com razão.
O problema é que um desinformado resolveu colocar Monteiro Lobato na história. Segundo ele, o internauta que chamara Abapuru de "merda" estava apenas refletindo a opinião já exposta anteriormente por Monteiro Lobato.
Foi o suficiente para a tag Monteiro Lobato chegar aos TTs e para mostrar como a esquerda pode ter tão analfabeta quanto a direita.
A tag teve de tudo, de gente dizendo que o Abapuru foi pintado por Anita Malfatti a gente dizendo que Lobato era inimigo do casal Oswald-Tarsila e até acusações de pedofilia.
Lobato era amigo íntimo de Oswald de Andrade e de sua esposa. Lobato era editor de Oswald e de vários outros modernistas. Lobato nunca criticou o Abapuru. Seu único texto sobre a semana de arte moderna, foi elogiando a semana e elogiando o gênio de Oswald (o que provocou ciúmes no Mário de Andrade). Aliás, Oswald queria que Lobato fosse o patrono da semana - acabou perdendo para Mário, que preferia Osvaldo Aranho.
Aliás, Abapuru foi pintado depois que Tarsila fez uma visita às cidades históricas de Minas Gerais e, encantada com o que viu, deixou de imitar a arte européia e passou a buscar uma arte tendo como referência a cultura nacional... que era exatamente a proposta de Monteiro Lobato para arte brasileira.

Território Lovecraft

 


Talvez o maior problema de Território Lovecraft, livro de Matt Ruff, seja o título. Ele dá a entender que a obra explora a mitologia de Lovecraft, o que não é verdade.
A história trata de uma disputa entre grupos mágicos que usam uma família de negros na década de 1950 como peões. O livro é todo estruturado em contos, cada um focado em um membro da família. Alguns têm uma pegada de terror, outros de ficção científica, outros de aventura e alguns até flertam com o humor. Essa estrutura é provavelmente um dos pontos altos da obra. Já existiram livros anteriores em que contos são costurados, a exemplo de Crônicas Marcianas, de Ray Bradbury. Mas a proposta de Ruff é inovadora: o conjunto de contos forma de fato um romance.
A primeira história, cujo título é exatamente Território Lovecraft dá o tom do volume: Um jovem, Atticus, recém saído da guerra da Coréia, volta para casa, descobre que seu pai desapareceu deixando apenas um bilhete misterioso e vai atrás dele junto com o tio e uma amiga. Já na estrada para casa ele é parado por um policial que o ameaça, revista seu carro e o dispensa com a condição de que ele irá dirigir diretamente para Chicago, sem parar em nenhum outro local.
O terror do livro está resumido ali: está muito mais no preconceito da américa segregacionista dos anos 1950 do que nos monstros em si. Era uma época em que um negro poderia ser linchado apenas por ter entrado na lanchonete errada – daí a importância do Green Book, que indicava estabelecimentos comerciais que atendiam negros. Aliás, a própria referência a Lovecraft no título parece ter mais relação com o racismo do autor do que com seus monstros. Esse aspecto será explorado em todas as narrativas do livro.
A obra é bem escrita, divertida – e nitidamente produzida para se transformar em um seriado de TV, com um final que lembra um final de temporada – e lança ganchos para uma segunda temporada.

Júlio Verne, o viajante das idéias

 



Houve uma época em que milhões de crianças no mundo todo se deliciavam com viagens extraordinárias em que o mundo se revelava diante delas trazendo consigo as maravilhas de uma nova ciência: a geografia. Tudo graças a um escritor francês dotado de imaginação e rigor na busca de informações. Seu nome era Júlio Verne.
Quando Verne publicou seu primeiro romance,  Cinco Semanas Num Balão, em 1863, as descobertas científicas aconteciam a um ritmo cada vez mais rápido. Darwin publicara há cinco anos seu livro A Origem das Espécies, de Darwin. Há pouco tempo Pasteur divulgara suas descobertas, que derrubavam a teoria da geração espontânea de vida e lançava a teoria dos vermes como causadores de doenças. Entretanto, o povo, o cidadão comum, ainda via a ciência como uma desconhecida, uma curiosidade de laboratório, de interesse apenas de homens sábios. Pouco havia sido escrito que fosse do entendimento do homem comum e, principalmente, das crianças.
Cinco semanas num balão começou com o nome de A Viagem no ar. Em outubro de 1862, Júlio Verne apresentou o original para o editor Pierre-Jules Hetzel. Hetzel foi tão importante no direcionamento da carreira desse, então estreante escritor, que pode, de certa forma, ser considerado co-escritor. O livro era uma referência direta aos exploradores que revelavam os segredos da África. Nele, o doutor Samuel Fergunson, seu amigo Dick Kennefy e um empregado se aventuram do Zanzibar até o Niger em um balão, refazendo o percurso de muitos dos homens que desbravaram o continente. Hetzel fez várias sugestões para tornar a história mais palatável, inclusive a mudança do título para Cinco semanas num balão. Hetzel tinha tanta confiança no texto de Verne que o fez assinar um contrato para outros livros. O contrato dizia, abertamente que o objetivo dos livros era: “Resumir todos os conhecimentos geográficos, geológicos, físicos, astronômicos, acumulados pela ciência moderna e refazer, sob a forma atrativa e pitoresca que lhe é própria, a história do Universo”.   
Em Cinco Semanas Num Balão, Júlio Verne, com o auxílio de Hetzel, introduzira um novo tipo de novela - uma forma diferente de contar história, um misto de ficção e realidade.
Qualquer itinerário serviria para o Vitória, mas a viagem tornara-se mais real porque acompanhava claramente o percurso da expedição de 1850 levada a cabo pelos exploradores Richard Francis Burton e John Hamming Speke.
Quanto à construção do balão, Júlio Verne tornara-a perfeitamente praticável com seu complicado fogão que provocava a expansão do hidrogênio por meio de aquecimento, fazendo o aparelho elevar-se sem ser necessário sacrificar lastro. A idéia do balão duplo foi tomada de Mensnier de Laplace e Nadar; a bateria elétrica viera das experiências  de Albert Wilhehn Bursen e a luz brilhante do arco improvida para arrancar o desgraçado missionário lazarista às torturas infligidas pelos selvagens africanos viera dos manuscritos de Humphry Javoy.
Tudo isso deu à história uma verossimilhança que jamais se vira em um livro de aventuras, abrindo caminho para toda a literatura de ficção-científica do século XX. Mais: a obra de Verne se tornou a base do gênero Steampunk, um dos mais populares e importantes do século XXI.
Depois de Cinco semanas em um balão, vieram diversos outros livros, como Viagem ao centro da Terra, A volta ao mundo em 80 dias, Da Terra à Lua e, o mais famoso deles, 100 mil léguas submarinas.

Os quadrinhos de faroeste

 


            Com a queda na venda dos super-heróis, as editoras começaram a investir em outros gêneros e um dos que tiveram melhor retorno foi o faroeste. As primeiras incursões aconteceram já na década de 1920, nas tiras de jornais e depois nos gibis. Entre os personagem dessa época, destacam-se Bufallo Bill (de Harry O´Neil), Rei da Polícia Montada (de Allen Dean) e Red Ryder (de Fred Harman), que depois mudaria seu nome para Bronco Piler, sem qualquer explicação aos leitores.
            Em 1932 surgiu aquele que seria provavelmente o mais famoso herói de faroeste: Lone Ranger (Cavaleiro Solitário). O personagem, um cowboy que usava máscara para esconder sua identidade e tinha como companheiro o índio Tonto, surgiu no rádio, criação de George Trendle e Fran Stiker. Depois foi para as tiras de jornais, no traço de Charles Flanders e para os gibis, com desenhos de George Wilson. No Brasil, esse personagem foi batizado de Zorro, que era o nome de outro personagem, o herói de capa e espada criado por Johnston McCulley. Em decorrência disso, tivemos, no país, dois personagens diferentes com o mesmo nome.
            Assim como o Lone Ranger, vários outros cowboys do rádio ou do cinema migraram para os quadrinhos. Entre os mais famosos, estão Roy Rogers, Durango Kid (que mereceu até uma música de Raul Seixas), Tom Mix e até o cachorro Rintintin.
            Mas nem sempre essa transposição era imediata. Um dos faroestes mais bem realizados, Cisco Kid, com texto do americano Rod Red e desenhos do argentino José Luís Salinas, surgiu na literatura, virou filme em 1929 e só 20 anos depois ganhou sua versão em quadrinhos.
            No rastro de Lone Ranger, muitas outras editoras lançaram heróis mascarados, como Black Diamond, Fantasma Vingador e O Cavaleiro Negro (Black Rider). Esse último, desenhado por Sid Shores, alcançou grande sucesso no Brasil, O título chegou a mais de 200 edições lançadas. Quando a Marvel cancelou o título nos EUA, a RGE, que publicava a revista no Brasil, não quis largar o osso e adaptou o personagem espanhol Gringo para que ele fizesse as vezes do Cavaleiro Negro. Primaggio Mantovi e Walmir Amaral eram responsáveis por adaptar os desenhos. Aparentemente, os leitores não perceberam a troca, pois a revista continuou vendendo bem.
            Outro personagem de sucesso da Marvel foi Two-Gun Kid, a HQ de Western mais duradoura dos EUA, tendo durado 31 anos e sendo cancelada apenas em 1979. O personagem era um mocinho que fora injustamente acusado de assassinato e vivia sendo perseguido por xerifes e caçadores de recompensa.
            Em 1955 surgiu Rawhide Kid (Billy Blue, no Brasil). Foi um personagem de sucesso até o final da década de 1970, mas ficou marcado mesmo pelo seu retorno em 2003, numa história em que se revelava que ele era gay.
            A DC Comics também investiu pesado no faroeste, embora seu personagem mais famoso, Jonah Hex, tenha surgido só na década de 1970.
            Existiu até um cowboy nacional. Era Jerônimo, o herói do sertão. Sempre ajudado pelo moleque Saci, ele surgiu no rádio, mas migrou para os quadrinhos em 1957, tendo estrelado 92 gibis mensais e cinco almanaques especiais. Era escrito por Moysés Waltman e desenhado por Edmundo Rodrigues e publicado pela RGE.
            Depois do auge do gênero, na década de 1950, os cowboys foram entrando em decadência. Muitos acreditam que isso se deve à corrida espacial. Com a chegada do homem ao espaço, os leitores (em especial os norte-americanos) não queriam mais olhar para o passado, mas para o futuro. Isso deu um novo destaque aos super-heróis, cuja temática podia ser melhor adaptada aos novos tempos científicos.
            Poucas editoras norte-americanos ainda investem nos cowboys. Curiosamente, os países europeus é que ainda mantém o interesse pelo gênero, em especial os franceses (com personagens como o tenente Blueberry) e os italianos (com personagens como Tex).

Vingadores contra o Fantasma do Espaço

 


O lançamento da revita dos Vingadores foi uma verdadeira sensação entre os fãs. Afinal, eram alguns dos principais heróis da Marvel reunidos. Mas depois da edição de estreia, em que o grupo lutou contra Loki, Stan e Jack Kirby precisavam de um inimigo à altura.

No número dois de The Avengers o grupo enfrenta um extraterrestre chamado Fantasma do Espaço, dono de um poder realmente impressionante: tomar o lugar de qualquer pessoa, enquanto essa pessoa é enviada para o vácuo. Ele pretende usar esse poder para derrotar os Vingadores colocando um contra o outro e, assim, abrir caminho para uma futura invasão extraterrestre.

Mas o fantasma do espaço é muito burro. Logo no início da história ele diz que sabe que Tony Stark é na verdade o Homem de Ferro. “Eu sei o segredo de todos eles, afinal, estou observando-os há meses!”.

Chegando à mansão, ele toma o corpo do Hulk e ataca os outros, com a intenção de causar desunião no grupo de heróis.

O problema é quando ele sai e encontra com Rick Jones e não o reconhece. “Sou eu, Rick Jones, o garoto que salvou a sua vida. O cara que se certifica que você consiga voltar a ser o Dr. Bruce Banner”. Ao que o alienígena pensa: “Então... o Hulk tem outra identidade?”. Ele estava observando o grupo há meses, mas não sabia que Bruce Banner era o Hulk? Não sabia da amizade com Rick Jones?

Hulk não gosta de reuniões. 


Não bastasse isso, ele também se revela como um alienígena que tomou o corpo do Hulk e faz até uma demonstração – o que inclusive vai provocar sua derrota lá na frente.

Parecia que o vilão tinha algum tipo de compulsão suicida que fazia com que ele criasse as situações de seu próprio fracasso.

Além disso, é muito curioso, hoje em dia, ver o Hulk soltando esse tipo de péroloa: “Agora que a turma toda tá aqui, o que a gente faz? Não tô no clima pra brincar de beijo, abraço, aperto de mão!”.

Era uma época de quadrinhos mais ingênuos, mas divertidos.  

Jornada nas estrelas – Não há beleza na verdade?

 


Na Terceira temporada, Jornada nas Estrelas estava para ser cancelada e faltava dinheiro para a produção.  A solução era produzir histórias que aproveitassem os cenários já existentes. Dessa limitação orçamentária surgiu aquele que é certamente um dos melhores de toda a franquia. Trata-se de “Não há beleza na verdade?”, escrito por Jean Lisette Aroeste.

Na trama, a Enterprise recebe a missão de levar o embaixador medusiano Kolos. Os medusianos, embora tenham alcançado um elevado nível espiritual e intelectual, são seres tão feios que sua simples visão pode provocar loucura em um ser humano.

Os únicos seres humanoides capazes de suportar a visão de um medusiano são os vulcanos, mesmo assim apenas com o uso de óculos especiais.

Curiosamente, a assessora do embaixador é uma humana, Miranda Jones, uma telepata que estudou disciplina mental no planeta Vulcano.

A trama de fato se desenrola quando um homem, que é apaixonado por Miranda, tenta matar o embaixador e, no processo, enlouquece. Totalmente fora de si, ele toma o controle da nave e a leva para um local não mapeado do espaço. A única maneira de retornar é Spock realizar o elo mental com o embaixador, absorvendo as habilidade de navegação dos medusianos. Mas no processo ele se torna vítima do ciúmes de Miranda, que se apaixonou por Kolos.

O episódio tem pouca ação, acontece todo dentro da Enterprise, e é todo calcado nos excelentes diálogos, como o do jantar ou quando Kirk leva Miranda para conhecer a floricultura da nave. Os efeitos especiais são os mais pobres possíveis: o embaixador é carregado em uma caixa que quando aberta emite luzes caleidoscópicas, um recurso que, surpreendentemente funciona muito bem, graças especialmente à ótima atuação de Leonard Nimoy.

A grande discussão por trás do espisódio já pode ser entrevisto no título: o que é de fato a beleza? Uma criatura extremamente feia pode, no fundo, ter uma alma bela, enquanto que alguém aparentemente bonito, pode ter uma alma feia? O episódio nos alerta para não confundirmos aparência com essência.

quarta-feira, setembro 28, 2022

Quais foram as descobertas da ciência nazista?

 


Até há pouco tempo, achava-se que as experiências nazistas em campos de concentração eram apenas demonstrações de sadismo, sem qualquer tipo de metodologia científica que tornasse os resultados válidos. No entanto, pesquisa recente, realizado pelo Instituto Max Planck, na Alemanha, mostra que os nazistas avançaram em diversas áreas.
As pesquisas sobre hipotermia (efeito do frio sobre o corpo humano), por exemplo, só puderam avançar graças à total falta de ética dos cientistas nazis. Eles colocavam prisioneiros em banheiras repletas de gelo para saber quanto tempo uma pessoa aguentava em frio extremo e o que melhorava a expectativa de vida, uma pesquisa importante em vista dos aviadores alemães que caiam nos mares gelados do norte da Europa. Eles descobriram, por exemplo, que protegendo o pescoço, aumentavam a chance de sobrevivência, razão pela qual os coletes salva-vidas a partir de então passaram a ter uma proteção para o pescoço.
Além disso, os nazistas fizeram pesquisas importantes, relacionando, estatisticamente, o cigarro com o câncer de pulmão.
Na área de anatomia, os alemães eram os únicos que tinham a possibilidade de dissecar pessoas vivas para ver como funcionava o organismo. Sigmund Rascher, responsável pelo campo de concentração de Dachau, dizia que era o único que de fato conhecia a fisiologia humana, pois “fazia experiências com homens, e não com ratos”.

A grande questão é se temos autorização ética para usar os resultados dessas pesquisas.  

Os comícios nazistas

 


Um dos mais importantes instrumentos de propaganda nazista eram os comícios. Eles eram assistidos por centenas de milhares de pessoas. Para que os presentes fossem envolvidos pela idéia da alemanha grandiosa, os cenários eram cuidadosamente pensados e teatrais. Tudo era imenso: colunas, suásticas, símbolos.
No início o próprio Hitler desenhava os cenários, mas depois ele contou com preciosa colaboração do arquiteto Albert Speer. Speer comprendia melhor que ninguém a explosão de emoção nas quais deveriam ser transformados os comícios.
No meio de toda essa grandiosidade, holofotes dirigiam fachos de luz para um ponto central mais elevado, no centro do espetáculo. Para essa catedral de luz, Hitler marchava solenemente, seguido por uma grande procissão.
Saudações estrondosas emcobriam o som da banda de música. O fuhrer subia e ficava lá, esperando o silêncio total.
De repente aparecia na distância uma procissão vermelha  que avançava na direção do líder. Eram 25 mil bandeiras nazistas, um verdadeiro mar de suásticas.
Quando Hitler começava a falar, toda a multidão já se encontrava em um estado de fervor e excitação extremos.

Doutor Estranho e Doutor Destino: Triúnfo e tormento

 


Um dos diferenciais que fizeram o sucesso da Marvel era a forma tridimensional como os personagens eram apresentados. E não só os heróis, mas também os vilões. Estes não eram maus por serem maus, mas sempre tinham uma boa motivação por trás de seus atos. E, entre todos os vilões, um dos mais complexos era o Dr. Destino.
Poucas obras exploraram tão bem essa complexidade quanto a graphic novel Triunfo e Tormento, escrita por Roger Stern com desenhos de Mike Mignola.
Na história um eremita chamado Gengis convoca todos os principais magos do mundo para um desafio. Quem vencer, será reconhecido como mago supremo.
Curiosamente, o Doutor Destino é chamado. Embora seja mais reconhecido por suas conquistas tecnológicas, descobrimos que ele é um mago de relativo poder e muita astúcia, tanto que acaba ficando em segundo lugar na disputa.
Os principais magos do mundo são chamados para uma disputa. 


Terminado o torneio, o vencedor deve conceder uma dádiva ao segundo lugar. E o que o vilão pede ao herói? Para salvar a mãe, presa no inferno por Mefisto.
Descobrimos então que a mãe do vilão fez um pacto com o demônio para libertar seu povo, os ciganos, da terrível perseguição de um barão. Mas não se pode confiar num demônio. Tudo acaba dando errado e a alma da mulher é aprisionada no inferno.
Os dois vão ao inferno resgatar a mãe de Destino. 


Cabe agora aos dois doutores descer às profundezas infernais e resgatar a mãe de Victor Von Doom.
Mignola é um dos desenhistas mais queridos de sua geração, e não sem razão. Seu traço expressivo, com forte constraste de luz e sombra é perfeito para essa história de magia e inferno.
O desenho de Mignola é perfeito para a história. 

Mas o roteiro é realmente a grande atração. Roger Stern faz uma história repleta de ação, mas principalmente com ótimo aprofundamento dos personagens, em especial do Dr. Destino. Conhecemos sua história e nos surpreendemos ao perceber que sua maior motivação é salvar a mãe. Por outro lado, durante uma alucinação, o doutor estranho se vê como um médico arrogante e interesseiro. Aí temos a grande inversão que faz essa história ser genial: o herói à certa altura é mostrado como alguém que só pensava em dinheiro e o vilão como alguém cujo maior sonho é salvar a mãe. No final, bem amarrado, ambos têm um tipo de rendenção.
São histórias como essa que faziam com que a Marvel fosse uma editora tão especial.
Essa história foi lançada no número 5 da coleção Graphic Marvel, da Abril, e, mais recentemente, pela Panini.

A incrível arte dinâmica de Leinil Francis Yu

  


Leinil Francis Yu é um artista filipino de quadrinhos cujo estilo ele mesmo define como dinâmico pseudo-realista. Ele começou sua carreira nos comics trabalhando para a Wildstorm e depois fez trabalhos para a Marvel e DC.