sábado, dezembro 31, 2022

Lugar Nenhum, de Neil Gaiman

 



Na segunda metade da década de 1980, os comics americanos foram sacudidos por uma geração de quadrinistas britânicos. Vários artistas, entre desenhistas e roteiristas, invadiram a DC Comics e, embora trabalhassem com personagens menores, fizeram com que eles vendessem tão bem quanto as maiores estrelas da casa, como Batman e Superman. Entre esses artistas, dois se destacaram: Alan Moore e Neil Gaiman.
Alan Moore pegou o título do Monstro do Pântano em vias de ser cancelado e o transformou numa revista respeitada, ganhadora dos mais diversos prêmios. Depois escreveu Watchmen, uma das mais revolucionárias histórias de super-heróis de todos os tempos. O sucesso de seu trabalho fez com que ele retomasse a série V de Vingança, publicando-a pela DC Comics.
Neil Gaiman passou de fã a companheiro de Alan Moore. Inicialmente um jornalista especializado em quadrinhos, ele aproveitou a visita dos editores da DC à Inglaterra para mostrar seu trabalho em conjunto com o amigo Dave Mckean. Para isso, ele escolheu uma personagem obscura da década de 1970, que não interessava a nenhum artista famoso na época: a Orquídea Negra. A minissérie de luxo Orquídea Negra se tornaria um sucesso e revolucionaria o mercado com sua arte fotográfica e texto poético; mas, antes que fosse publicada, os editores sugeriram que Gaiman escrevesse um título mensal. Gaiman começou então sua carreira em Sandman, sendo Dave Mckean responsável pelas memoráveis capas. A primeira seqüência delas mostrava uma prateleira de madeira na qual o artista juntava cacarecos, desenhos e colagens. Ninguém nunca tinha visto aquilo numa história em quadrinhos e muitos certamente compraram Sandman pela primeira vez por causa das capas. Mas o que fez com que eles continuassem a comprar foi o texto excelente de Gaiman.
Em Orquídea Negra e Sandman, Neil Gaiman elevou os quadrinhos a um nível literário poucas vezes alcançado. Qualquer um que botasse os olhos naqueles gibis sabia que estava diante de um grande escritor. O autor trazia conceitos, técnicas e abordagem da literatura, fazendo com que intelectuais se tornassem fãs de Sandman. Até mesmo as mulheres, que normalmente são avessas aos comics americanos, acabaram se rendendo a Sandman. Nas filas de autógrafos, especialmente no Brasil, havia geralmente mais mulheres que homens.
Uma pergunta que todos faziam na época: como se sairiam esses artistas em um trabalho realmente literário? Alan Moore respondeu a essa questão com o romance A voz do fogo, um trabalho denso, pesado, até de difícil leitura, uma daquelas obras que permite várias e várias interpretações.
A resposta de Neil Gaiman foi Lugar Nenhum (Conrad, 2007, 336 págs.), romance escrito em 1996 e lançado recentemente pela editora Conrad.
Lugar Nenhum é adaptação de uma série de TV escrita por Gaiman para o canal britânico BBC. O personagem principal é Richard Mayhew, um jovem escocês que leva uma vida normal em Londres. Tem um bom emprego, mas meio chato, e namora uma garota ideal, embora meio chata.
Mas um dia ele encontra uma garota ferida na rua e, após socorrê-la, sua vida muda completamente. Seus colegas e até sua namorada o ignoram, como se ele não existisse, seu apartamento é alugado para estranhos. Ele não consegue nem mesmo pegar um táxi. É que ele passou a fazer parte da Londres de Baixo, onde vivem os tipos mais excêntricos: assassinos letrados, monges negros, nobres decandentes, falantes de ratês e muitos outros. Agora, para recuperar sua vida de volta, Richard precisa ajudar Door, a garota esfaqueada, a descobrir quem matou sua família.
Como se vê, Gaiman preferiu, em seu primeiro romance, seguir a mesma linha fantástica que o caracterizou em Sandman. Ele decidiu pisar em terreno conhecido e que domina como ninguém. Vale lembrar que muitos afirmam que Harry Potter é uma cópia de Os livros da magia, obra em quadrinhos escrita por Neil Gaiman.
Se em Sandman e Orquídea Negra, Gaiman trouxe para os quadrinhos técnicas e temas literários, em Lugar Nenhum ele faz o caminho inverso. Trouxe para a literatura os avanços alcançados por ele nos quadrinhos. As semelhanças narrativas são óbvias. Quando a namorada dá o fora em Richard, ele vai para casa e o texto narra: "ele tomou um demorado e quente banho de banheira, comeu alguns sanduíches e bebeu várias xícaras de chá. Viu um pouco de TV, à tarde, e ensaiou conversas com Jéssica em sua cabeça. Ao término de cada diálogo imaginário, eles se abraçavam e faziam sexo de um jeito selvagem, apaixonado, furioso, cheio de lágrimas, e tudo ficava bem". Em Sandman 17, na história "Calliope", Gaiman escreveu: "E Madoc levou Calliope para sua casa, e trancou-a no quarto mais alto, que havia preparado para ela. Seu primeiro ato foi violentá-la, na velha e mofada cama de armar. Ela nem mesmo é humana, ele disse a si mesmo. Ela tem milhares de anos de idade. Mas sua carne era quente, e seu hálito doce, e ela segurava as lágrimas como uma criança enquanto ele a feria".
Está ali, também, em Lugar Nenhum, os pequenos contos em meio às histórias maiores, que caracterizavam o roteiros de Gaiman. Em Lugar Nenhum acompanhamos, por exemplo, a história de Anaesthesia, uma garota que acompanha Richard pelo perigoso caminho até o Mercado Flutuante, onde ele deverá se encontrar com Door. A mãe de Anaesthesia ficou louca e ela foi mandada para morar com uma tia, que morava com um homem: "Ele me machucava. Fazia outras coisas também. No fim, eu contei pra minha tia e ela começou a me bater. Disse que eu estava mentindo. Disse que ia me entregar para a polícia. Mas eu não estava mentindo. Então eu fugi. Era meu aniversário". Com o tempo a menina foi se tornando invisível às pessoas, e um dia, quando acordou, fazia parte da Londres de Baixo.
A história da menina mostra a preocupação de Gaiman de construir um perfil até mesmo para os personagens menores. Cada um tem sua história de vida, sua personalidade e até seus cacoetes. As descrições detalhadas fazem com que, com o tempo, o leitor comece a ver essa outra Londres como um mundo ainda mais real do que aquele em que vivemos. São poucos os escritores que conseguem nos mergulhar assim em um mundo construído por eles.
Os que não iniciados no mundo das resenhas talvez não saibam, mas a maioria dos resenhistas lêem os livros com olhares críticos, analisando estilos, tramas e tudo o mais com um lupa racional. Confesso que houve um determinado ponto em Lugar Nenhum que foi impossível continuar fazendo isso, de tal forma a história era envolvente. O mesmo deve acontecer com um leitor comum desde os primeiros capítulos.
Se não bastassem os méritos literários, a Conrad (que publica os encadernados de Sandman) fez um ótimo trabalho editorial, ressaltado pela ótima capa de Dave Mckean (que os editores tiveram o bom-senso de preservar).

Ironias quadrinísticas

 


Uma das grandes ironias dos quadrinhos é que muitas vezes os criadores de determinado personagem acabam vendo suas crias se tornarem grandes sucessos nas mãos de outro autor. Isso era especialmente comum na era de bronze, em que roteiristas e desenhistas trocavam facilmente entre a Marvel e a DC.
Os exemplos são muitos.
Talvez o mais óbvio sejam os Novos X-men. Eles foram criados por Len Wein, que escreveu o primeiro número e entregou o título para um jovem estagiário da Marvel, Chris Claremont. Afinal, ele tinha coisas mais importantes para fazer, títulos mais importantes para escrever e os X-men nunca tinham sido um sucesso. Pouco tempo depois o grupo de mutantes se tornou um sucesso absoluto, especialmente depois da entrada de John Byrne nos desenhos. Em poucos anos era o título mais vendido da Marvel, os mutantes espalhava-se por vários gibis. O sucesso comercial foi tão grnade que Claremont ficou rico.
Len Wein, aliás, foi o roteirista criador do Monstro do Pântano, que fez algum sucesso na época, mas só se tornaria um sucesso absoluto de público e de crítica nas mãos de Alan Moore.
Aliás, Wein e Gerry Conway eram colegas de quarto. Não se sabe ao certo quem copiou quem, mas na época em que a DC lançou o Monstro do Pântano, Conway lançou o Homem-coisa na Marvel, uma sensação do recomeço do terror na editora, um título que estabeleceu nas mãos de Steve Gerber!
Um dos maiores sucessos da era de bronze foi o Mestre do Kung Fu, criado por Steve Englehart e Jim Starlin. Apesar de existirem na época diversos outros personagens tentando aproveitar a popularidade de Bruce Lee, alguns inclusive anteriores, foi Shang Chi que melhor captou o espírito dessa época. A revista foi uma das mais vendidas da Marvel, sendo publicada por anos... mas escrita por Doug Moench e  com desenhos de Paul Gulacy!
Outro exemplo é o personagem Demolidor, de Stan Lee e Bill Everett.
Everett tinha sido um dos criadores de Namor, o príncipe submarino, um dos maiores sucessos da Marvel na Era de Ouro e Lee queria trazê-lo para o barco nessa nova fase da editora. Assim surgiu o convite para desenhar o personagem. Mas Everett, que na época trabalhava com publicidade, mal conseguiu terminar o primeiro número. Foi substituído por Wally Wood e depois por outros desenhistas. Várias equipes criativas foram se sucedendo no personagem, que vendia cada vez menos.
No início dos anos 80 a revista estava para ser cancelada quando foi assumida pelo jovem Frank Miller, que revolucionou o personagem transformando-o num dos mais vendidos da Marvel. A popularidade do Demolidor de Miller era tão grande que no Brasil ele era o carro-chefe da revista Superaventuras Marvel. O personagem criado por Stan Lee e Bill Everett só se tornou realmente um sucesso nas mãos de Frank Miller.

A arte impressionante de Michael Whelan

 


Michael Whelan já ilustrou livros, revistras e capas para diversos autores de ficção científica como Isaac Asimov e Ray Bradbury. Mas é mais conhecido por suas ilustrações de dragões produzidas para a trilogia Dragonflight. 











Batman – Ninguém escapa do Desafiador


No número 86 da revista The Brave and the Bold, Batman enfrentou ninguém menos que o Desafiador. Esse personagem é um fantasma que tem como poder a capacidade de incorporar em pessoas, fazendo com que elas façam aquilo que ele quer.

É exatamente isso que acontece na história. Batman e Robin estão enfrentando uma gangue quando de repente Robin pega uma arma e tenta atirar no amigo. Quando ele é desarmado com um tapa, o Comissário Gordon entra no local e também tenta atirar no cavaleiro das trevas.

Robin tenta matar Batman... 


Segue-se uma sequência realmente empolgante do Batman fugindo pela rua e sendo atacado por diversas pessoas aleatórias. A sequência é brilhante principalmente pelo trabalho genial do desenhista Neal Adams, cuja arte e diagramação eram movimento puro.

... e outras pessoas fazem o mesmo. 


O roteiro de Bob Haney, que começa bem degringola quando tenta explicar porque o Desafiador está tentando matar o cavaleiro das trevas. É preciso forçar muito para aceitar a premissa. Além disso, a confusão da trama a partir de certo ponto também não ajuda.

As vacinas e a evolução da ciência

 

 O grande argumento dos que são contra a vacina para covid é dizer que uma vacina leva anos, décadas para ser criada.

De fato, a vacina para febre tifóide levou 104 anos.

A vacina para varíola levou 250 anos para ser aplicada em massa.
Se fosse considerar isso, uma vacina para covid só poderia aparecer daqui a 250 anos.
Mas esse tipo de raciocínio não leva em conta o desenvolvimento da ciência, que desde o século XX começou a ocorrer em progressão geométrica (1,2,4,8,16... ) ao invés de progressão aritmética (1,2,3, 4 ....).
Só para se ter ideia, acredita-se que só no século XX a ciência e a tecnologia avançaram mais do que em toda a história da humanidade. E apenas na primeira década do século XXI a ciência e a tecnologia avançaram mais que todo o século XX.
Então, uma vacina que antes levava 250 anos para ser elaborada hoje pode ser elaborada em meses com a tecnologia atual e especialmente se houver interesse político e financeiro.
A vacina para malária já está em pesquisa há mais de 100 anos e não se chega a uma vacina pela simples razão de que não há nenhum interese financeiro ou político no assunto. A rainha da Inglaterra não corre o risco de morrer de malária, o presidente dos EUA não corre o risco de morrer de malária, só quem corre o risco é o ribeirinho amazônico que não tem nem dinheiro para pagar pela vacina - então ninguém investe na vacina para malária.
Já o coronavírus paralisou a economia mundial e colocou a vida dos poderos em risco - então, há o maior interesse em descobrir-se logo a vacina, por isso houve tanto investimento. E por isso resultados tão rápidos.

Conan – O espelho de Karam-Akkad

 


Quando Barry Smith saiu da revista Conan the barbarian, Roy Thomas exigiu que a revista fosse desenhada pelo artista mais caro da Marvel, John Buscema. Quando havia lançado a revista, anos antes, ele queria que Buscema desenhasse o título, mas Martin Goodman queria um desenhista mais barato – e foi assim que Smith veio para o título.

Agora a situação mudara e Thomas se tornara editor-chefe da editora – a o gibi do cimério se transformara num dos mais vendidos do mercado.

Apesar do trabalho verdadeiramente espetacular de Barry Smith no título, o que os leitores devem ter pensado ao ler Conan – the barbarian 25 foi: John Buscema nasceu para desenhar o bárbaro, a começar pela splash page inicial, com o feiticeiro encapuçado segurando uma jóia na qual aparece Conan.



O tal do Karam-Akkad (incrível como os feiticeiros da era hiboriana tinham nomes ridículos!) tinha um espelho no qual via o futuro. E nesse espelho aparecera Conan matando-o, em meio à imagem com o leão, uma águia e uma serpente. Essa é a razão pela qual o feiticeiro colocara a cabeça do cimério a prêmio.

Uma das melhores sequências é quando o feiticeiro explica ao Tarim encarnado a origem do espelho – e vemos uma sequência simplesmente impressionante do Rei Kull. Como sabia que ia entrar muito texto, John Severin, desenhista desse trecho,  aliviou o cenário, dando uma leveza única para as duas páginas.



Mas não é só os artistas que brilham. Roy Thomas dá um show num roteiro em que tudo se encaixa, inclusive a simbologia expressa no espelho.

Uma curiosidade é que, ao assumir o título, John Buscema exigiu que a arte-final fosse feita pelo irmão, Sal. De fato essa edição conta com a arte-final de Sal Buscema, mas logo no número seguinte ele seria substituído pelo filipino Ernie Chan.  

No Brasil essa história foi publicada em Superaventuras Marvel 14.

sexta-feira, dezembro 30, 2022

Fundo do baú - Agente 86

 


Confesso. Agente 86 era um dos meus seriados prediletos quando eu era criança. A mistura de espionagem com humor conquistou mais de uma geração. Criado pelo gênio Mel Brooks (famoso por filmes de humor como A história do mundo e O jovem Frankstein), Agente 86 foi exibido 1965 a 1970. No total, foram 138 episódios.
O programa era protagonizado por Don Adams no papel de Maxwell Smart, um atrapalhado agente secreto que, surpreendentemente, consegue sempre vencer os agentes da K.A.O.S.
A abertura do seriado já dava o tom de humor: o agente 86 entrando nos escritórios da C.O.N.T.R.O.L.E, atravessando várias portas secretas e batendo o nariz na última.
Além da atuação magistral de Dom Adams, uma das principais atrações eram os apetrechos que apareciam no seriado, como o famoso sapatofone ou o cone do silêncio, que Maxwel Smart usa para conversar com o chefe, mas que invariavelmente apresenta algum problema que faz com que um não consiga ouvir o outro. Outra estratégia para conversar sem ser ouvido era aumentar a música, como ocorre num episódio em que dois agentes conversam numa loja – mas a música alta faz com que eles conversem aos gritos, para espanto dos outros clientes.

Kull, o conquistador, e a gata falante

 


As histórias do rei Kull se passavam num passado longíncuo em que a magia era tão presente quanto a realidade. Isso dava margem para que o trio Gerry Conway (roteiro) e Marie e John Severin (desenhos) criassem as mais curiosas histórias. Nenhuma delas, no entanto, parece tão inusitada quanto “A gata falante” publicada em Kull the conqueror 7.

Monstros, feiticeiros, zumbis tudo bem. Mas uma gata falante? Impossível!


A história inicia com Kull chegando no palácio e encontrando os soldados lutando contra um desconhecido. O tal homem chegou a matar dois soldados ao tentar entrar no palácio. Logo se descobre seu objetivo: ele é um plebeu apaixonado por uma nobre, Lady Delcardes. Apesar dos assassinatos, Kull não sentencia o homem à prisão, mas apenas ao exílio. Pouco tempo depois, assassinos tentam matar o rei e são impedidos por Brule, o lanceiro, que foi avisado pela... gata de Lady Delcardes!

Kull enfrenta muitos perigos... 


Todos ficam espantadíssimos ao saber que a gata fala e faz previsões. Algo no mínimo inusitado numa série em que aparecia todo tipo de criatura sobrenatural e o inimigo do protagonista era um mago.

Algum tempo depois a gata avisa o rei que Brule corre perigo no lago proibido, o que leva a uma sequência de ação em que o rei enfrenta todo tipo de monstro e consegue uma espada mágica que pertenceu a antigos reis. No final ele descobre que Brule nunca esteve ali.

... e ganha uma espada maneira!


Apesar do bom texto e do desenho mais do que competente dos irmãos Severin, essa é uma trama em que quase nada parece fazer sentido, deixando várias pontas soltas: como o servo que controlava a gata sabia da tentativa de assassinar o rei? Por que o feiticeiroThusa Doom envia o rei numa jornada que no final o colocará numa situação ainda mais favorável?

No Brasil essa história foi publicada em Superaventuras Marvel 30. 

Entenda por que os comentários estão sendo moderados

 


 - Gian, entrei no seu blog e tentei comentar numa matéria, mas não ele não foi publicado imediatamente 

- Infelizmente eu tive que acionar a moderação de comentários. 

- Mas por quê? 
- Olha o tipo de comentário que os bolsominions estavam postando. 



- Caramba, são dezenas de comentários iguais o cara já começa te chamando de stalinista! 

- Pois é, virei um "extremista de esquerda stalinista"! 
- Caramba! 
- É o culto à personalidade. Como eles consideram o Bolsonaro um semi-deus, qualquer um que não o idolatre é imediatamente chamado de comunsita, petista, stalinista, dentista, skatista, surfista, remista. E pode colocar na conta vários outros "comunistas": Jim Starlin vira marxismo cultural, Raul Seixas vira marxismo cultural, Alan Moore vira marxismo cultural. E, para eles, comunista precisa ser preso ou morto. Para eles a Globo é comunista, a Folha de São Paulo é comunista, o Estadão é comunista. Esse tipo de gente só se informa pelo zap zap e por canais bolsonaristas como o Terça-livre. Qualquer coisa fora disso é comunismo. 
- O cara está te chamando de lulo-petralha?!!!



- Pois é, eu que nunca votei no PT, que sempre critiquei o PT, que na época da faculdade vivia em pé de guerra com os petistas da turma, de repente virei petralha só porque me recuso a idolatrar o mito. 
- E você praticamente nem fala de política no seu blog. 
- Pois é. Mas a estratégia deles é Dart Vader: ou você idolatra o Capitão ou é comunista, stalinista, petista, skatista, surfista, dentista, remista. Teve um "amigo" bolsominions que ameaçou me dar um soco só porque eu disse que político é para ser cobrado não para ser idolatrado. Outro disse que o pior tipo de "comunistas" são os "isentões": isentão aí significa alguém que se recusa a idolatrar o mito deles, mas ao mesmo tempo não idolatra o Lula, que se recusa a tecer elogios à ditadura militar, mas também não elogia a Coréia do norte. Antigamente para ser comunista precisava ser fã do Karl Marx, precisava ler o Manifesto Comunista, precisava acreditar em ditadura do proletariado. Hoje em dia, para ser comunista, basta não idolatrar o mito.
- Ele te acusa de cometer um gesto lulo-petista. Que gesto lulo-petista é esse?
- Me recusar a idolatrar o mito. Para quem escreveu esse comentário, qualquer um que não idolatre o mito está cometendo um gesto lulo-petista. Ou seja, na cabeça dele, está cometendo um crime. São pessoas que só se informam pelo zap zap e por vídeos de teoria da conspiração.
- Caramba, estou lendo aqui. O cara está ameaçando te denuncia... Te denunciar para quem? 
- Para os militres, provavelmente. 




- Estou vendo aqui. Ele te acusa de doutrinar os alunos. Fui seu aluno e você nunca falou de política em sala de aula. 
- Deve ser porque uso camisas da Marvel em sala de aula. Dizem que estou doutrinando os alunos a gostarem da Marvel. Nisso, confesso, sou culpado. Mas em minha defesa posso dizer que gosto da DC quando ela é desenhada pelo Garcia-Lopez.... rsrs... 
- Nossa, o cara diz que vai fazer você perder o emprego! Chega até a te chamar de estelionatário! 
- Só faltou dizer que vai me prender e  torturar pessoalmente para que eu confesse todos os meues crimes...kkkk Tudo isso porque eu me recuso a idolatrar o Capitão. E é esse pessoal que diz que é a favor da liberdade. A liberdade que eles querem é a liberdade de poder denunciar e prender quem pensa diferente deles. E como você pode ver, postaram essas ameaças dezenas de vezes no blog antes que eu bloqueasse os comentários. É por isso que não é mais possível comentar no meu blog. Infelizmente, tive que bloquear essa possibilidade de contato com meus leitores por causa desse tipo de comentário ameaçador.   
- Assustador, melhor manter os comentários do blog moderados mesmo.  
- Pois é. Melhor do que dar voz a gente desse naipe, que só se informa pelo zap zap e acredita em todas as teorias da conspiração possíveis. 

O que são paradigmas?

 

Uma das expressões mais recorrentes no vocabulário de quem tenta falar difícil é paradigma. No entanto, são poucas as pessoas que conhecem o real significado dessa palavra.
O termo paradigma, no sentido definido pelo filósofo T.S. Kuhn, está intimamente relacionado à ciência e às revoluções científicas. Ele representa um guia, para análise e interpretação da natureza. Ou, como costumo dizer, é um óculo que ajuda o cientista a ver e compreender a natureza.
Vamos a um exemplo. Durante uma aula de ciências, o professor solta uma pedra e ela cai ao chão. O mestre, em seguida, explica aos alunos que o objeto despencou em decorrência da força da gravidade, que o puxou para baixo.
         A explicação é baseada no paradigma newtoniano, segundo o qual matéria atrai matéria. Quanto maior o objeto, mais atração ele exerce. Como nosso planeta é muito maior que a pedra, ele a atrai, e não o contrário.
Assim, o paradigma estabelecido por Newton nos ajuda a observar e entender o fenômeno das coisas que caem.
A explicação pode parecer óbvia, mas não é. Os aristotélicos, anteriores a Newton, tinham uma maneira diferente de compreender o fenômeno. Para eles, a tendência das coisas é voltar ao seu estado natural. O estado natural dos objetos pesados é os locais baixos, assim como o estado natural das coisas leves são os locais altos. Assim, uma pedra cai pelo mesmo motivo pelo qual um balão sobe: ela está voltando ao seu estado natural.
Digamos, no entanto, que, ao invés de cair, a pedra fique flutuando no ar. Professores e alunos certamente ficariam estarrecidos. Por quê? Porque a natureza estaria contrariando o paradigma. A pedra voadora seria uma anomalia, um fenômeno que não se encaixa na expectativa que temos com relação à natureza.
(Detalhe: um bebê não acharia nada de anormal no episódio, pois ele ainda não aprendeu o paradigma segundo o qual as coisas caem quando soltas)
A maioria dos cientistas tende a ignorar as anomalias. “Ei, crianças! Isso é apenas uma alucinação. Essa pedra não está flutuando”, diria o professor.
Mas alguns pesquisadores, jovens e aventureiros, decidem pesquisar a anomalia e descobrem que, para explicá-la, é necessário mudar a maneira como vemos o mundo. São as chamadas revoluções científicas.
A história é repleta de revoluções científicas: o Heliocentrismo de Galileu; a Teoria da Evolução, de Darwin; a Teoria da Relatividade, de Einstein e, mais recentemente, a Teoria do Caos.
Ao contrário do que se poderia pensar, ou do que nos fazem crer os livros de história, os cientistas revolucionários dificilmente são aclamados pela sociedade de seu tempo. Galileu quase morreu na fogueira. Darwin sofreu todo tipo de crítica. A Teoria do Caos chegou a ser acusada de charlatanismo.
A principal contribuição da noção das revoluções científicas parece ter sido acabar com o mito da ciência acumulativa, vista como um muro no qual cada cientista ia acrescentando seu tijolinho. Durante as revoluções científicas, gerações de novos pesquisadores entram em conflito com os cientistas “normais”. E o que definirá se um paradigma irá sobreviver não é a sua cientificidade, e sim sua capacidade de explicar o mundo. E, bem, há uma outra razão: a comunicação. Triunfam aquelas teorias cujos adeptos divulgam seu ponto de vista. 

Aquaman, o filme

 

Os heróis da DC são, essencialmente, seres mitológicos. São aspirações do que os leitores gostariam de ser. Tanto que muitos deles têm origem mitológica. Durante muito tempo os filmes da DC ignoraram isso, forçando uma imagem de heróis atormentados (que pode funcionar no Batman, mas certamente não funciona no Super-homem) e filmes pesados, escuros. O filme da Mulher Maravilha já havia resgatado o tom mitológico, mas é Aquaman que resgata a DC na tela: um filme divertido, com ação no ponto certo, que explora a mitologia do personagem e não tem medo de usar cores. A DC parece finalmente ter encontrado seu caminho na telona. O irônico é que isso tenha acontecido justamente com o Aquaman, o personagem piada entre os produtores de Hollywood. 

A história de Cleópatra

 


Cleópatra é uma das figuras mais fascinantes na história. Sua vida mistura mito e história e tem inspirado pintores, cineastas e escritores. As dúvidas sobre ela são maiores que as certezas: Ela teria sido tão bonita quanto Elizabeth Taylor? Teria realmente morrido ao ser picada por uma cobra?
São essas algumas das perguntas que a jornalista Arlete Salvador tenta responder no livro Cleópatra, da editora Contexto.
Arlete é jornalista especializada em política e mestre em relações internacionais pela Universidade de Birmingham, na Inglaterra. Trabalhou em alguns dos mais famosos órgãos de imprensa do Brasil, como a revista Veja e os jornais O Estado de São Paulo e Correio Braziliense. Seu trabalho com os bastidores da política fez com que ela se interessasse pela lendária rainha do Egito. “Além do aspecto político, a vida de Cleópatra tem amor, sexo e sedução. A rainha foi amante de dois dos homens mais poderosos do mundo naquele tempo. Teve um filho com Júlio César, mais velho e maduro do que ela, e três com Marco Antônio, jovem, audacioso e ambicioso”.
O livro inicia com a desconstrução do mito e é um dos mais interessantes. Começa com a discussão sobre a morte da rainha. A versão mais conhecida é a de que ela, prisioneira de Otávio, após a derrota na guerra, recebe um cesto de frutas nas quais há uma cobra, que a mata. Essa é a versão do filme de 1963 dirigido por Joseph Leo Mankiewcz.
Por mais inverossímel que pareça, essa é a versão aceita por vários historiadores.
Plutarco afirma que Cleópatra colecionava venenos e testava em prisioneiros condenados à morte. Segundo o historiador, ela logo descobriu que os que matavam mais rápido provocavam mais dor, enquanto os mais suaves demoravam mais a fazer efeito. Ela teria testado todas as serpentes até encontrar uma cuja picada induzia a um topor e estremeciemento sem espaços ou gemidos. A pessoa ia apenas relaxando, até morrer, como se estivesse em sono profundo.
Mas Plutarco escreveu sobre a rainha muito depois de sua morte e sua versão pode ser mais baseada em fofocas do que em fatos.
O historiador Cássio Dio, afirma que ninguém sabe ao certo como ela morreu. “as únicas marcas no seu corpo eram pequenos pontos escuros no braço. Alguns dizem que ela ofereceu o braço a uma serpente que lhe havia sido trazida num jarro de água, ou, talvez, escondida em flores. Outros declaram que ela tinha um camafeu de cabelo com um veneno especial”.
Assim, as versões sobre sua morte são muitas. Uma delas afirma que ela teria sido assassinada por Otávio ou a mando dele. Como, mesmo após a derrota, ela não abaixou a cabeça e continuou lutando para readquirir o poder, seria muito inconveniente para o imperador livrar-se dela.
Outro ponto de polêmica é sobre a beleza da rainha. O fato de ela ter encantado dois dos homens mais importantes do império romano fazem com que muitos acreditassem que ela fosse belíssima. As pinturas feitas sobre Cleópatra, como a de Alexandre Cabanel, a mostram bela e fútil. Mas moedas encontradas recentemente em pesquisas arqueológicas, a mostram nariguda e feia.
Arlete Salvador lembra que bustos, estátuas e moedas da época a mostram com representações diferentes. A razão é que esses objetos nem sempre eram feitos para mostrar o governante como ele de fato era. Sua função era muito mais política. Se quisesse parecer poderoso e rigoroso, o rei aparecia com semblante sério. Se quisesse aparecer complacente, era retratado com a face tranquila e juvenil. O nariz grande, por exemplo, era uma demonstração de poder. Além disso, como o imperador Otávio usou a estratégia de denegri-la, argumentando que ela havia enfeitiçado Marco Antônio para que este se virasse contra Roma, muitas das imagens a mostram como lasciva. Se sua aparência física gera polêmica, seus atributos intelectuais são uma unanimidade. Inteligente, charmosa e culta, ela falava oito línguas, inclusive o egípcio, língua que seus outros parentes que chegaram ao poder nunca se preocuparam em aprender (Os Ptolomeus praticamente ganharam o Egito quando o império de Alexandre, o grande, se desmantelou). Ela era versada em filosofia, alquimia e matemática. Também era uma grande estrategista política, que conseguia dar a volta por cima mesmo quando parecia derrota, como quando ela, que havia sido alijada do poder, deu um jeito de entrar no palácio dentro de um tapete e apareceu numa na frente de Júlio César para seduzi-lo.
É essa figura inteligente, sedutora, esperta e enigmática que o livro desvenda em detalhes. Um capítulo imperdível é o epílogo, em que a autora trata da representação da rainha na cultura pop, dos quadrinhos de Asterix ao filme com Elizabeth Taylor, passando pela musa Theda Bara, com seu olhar superior, vestes ousada e pose sexy do filme de 1917.   
O texto de Arlete Salvador é leve e agradável e a edição é caprichada, com representação de imagens de filmes, achados arqueológicos e pinturas.
Certamente não é um livro aprofundado, mas serve como boa introdução para os que estão interessados nessa enigmática personagem e sua época. 

quinta-feira, dezembro 29, 2022

Homem-aranha e Punho de Ferro - Por uns punhos a mais

 

Marvel Team-Up era uma revista que mostrava encontros dos mais inusitados heróis da Marvel com o Homem-aranha. Como o gibi do aracnídeo era de longe o mais vendido da editora, essa era uma forma de também de promover heróis menos conhecidos, ou que tinham surgido há pouco tempo.

No número 31 o Aranha se encontra com Punhos de ferro, um herói criado na onda dos filmes e seriados de kung-fu. Como é comum no padrão da revista, os dois personagens se encontram, brigam entre si e só depois param para conversar. Essa história não foge do padrão, mas se destaca pelo texto divertido e original de Gerry Conway: “Eu vou gravar essa história porque, se o que me disseram é verdade, não vou me lembrar de nada amanhã de manhã... e não posso esquecer dessa aventura de jeito nenhum. Tudo começou quando madruguei pra tomar café da manhã a poucas quadras do meu novo cafofo. Eu não dormi... tava quase amanhecendo... e eu sabia que, se quisesse sobreviver ao dia seguinte, precisava de comida. Mas o meu café... veio acompanhado de muita violência”.

O café da manhã de Peter Parker é interrompido por um porradal. 


Na sequência, o Punhos de ferro entra no café brigando com dois bandidos e quebrando tudo.

Só no final da história vamos perceber que é Peter Parker que está narrando a história e porque ele está fazendo isso – o que gera uma bela ironia.

O vilão é outra sacada interessante: ele é um homem que nasceu velho e rejuvenece a cada dia. Sim, uma versão quadrinística de Benjamin Button. Mas aqui a coisa vai um pouco mais além: tudo nele é reverso, inclusive suas falas, que são de trás para a frente.

O culpado é um vilão que fala ao contrário. 


Esse vilão provoca a briga do aracnídeo contra o Punho como forma de captar a energia deles e tentar reverter o processo, algo muito mal explicado e bem forçado.

Os desenhos são de Jim Mooney, um desenhista subestimado da Marvel, que, embora não fosse genial, conseguia bons resultados. O problema aqui é que a arte-final é de Vince Colletta.  

Em tempo: o título da história é uma referência direta ao filme Por uns dólares a mais, do cineasta italiano Sergio Leone.

No Brasil essa história foi publicada em Almanaque do Homem-Aranha 2, da RGE.