A maioria das pessoas que defende o projeto Escola sem
partido acredita que quem será afetado será aquele professor militante
político, o cara que vai para a escola vestindo boina e camisa de Chê Guevara.
Outros se baseiam apenas no nome da lei, um nome completamente enganoso, já que
a lei não proíbe partidos de fazerem campanhas eleitorais dentro das escolas.
Na verdade, a coisa toda foi muito bem pensada: acharam um
nome com o qual todo mundo concordasse para agradar um grupo de radicais,
parecer fazer o bem e, ao mesmo tempo, estimular ao máximo denúncias contra
professores.
Quase ninguém que defende o Escola sem partido leu o
projeto, que no seu preâmbulo parece lindo, diz favorecer o debate na sala de
aula, os vários pontos de vista etc...
Mas a coisa realmente complica é no trecho que define o que
é proibido, o que é denunciável.
Como políticos são políticos, eles envolveram sua pílula num
doce bonito e gostoso, mas o que era realmente importante estava no artigo 3:
"Art. 3º. São vedadas, em sala de aula, a prática de
doutrinação política e ideológica BEM COMO A VEICULAÇÃO DE CONTEÚDOS OU A
REALIZAÇÃO DE ATIVIDADES QUE POSSAM ESTAR EM CONFLITO COM AS CONVICÇÕES
RELIGIOSAS OU MORAIS DOS PAIS OU RESPONSÁVEIS PELOS ESTUDANTES"
Observem como as
palavras foram muito bem escolhidas para permitirem o máximo de denúncias. O
texto poderia ter parado em doutrinação política e ideológica (e até aí eu
concordo plenamente). Mas observe que depois vem a proibição de qualquer conteúdo
ou atividade que possa estar em conflito com as convicções religiosas ou morais
dos pais.
Observem como é evitada a palavra ética em prol da palavra
moral.
A ética trata de princípios básicos, universais, de
convivência humana. O que é ético, é sempre ético. A moral varia de pessoa para
pessoa, de cultura para cultura e até de época para época. Não é à toa que a
lei fala em convicção, o que destaca o valor individual da moral.
Não faz muito tempo, o casamento entre uma mulher branca e
um homem negro era considerado imoral (para algumas pessoas ainda é). A
escravidão foi considera moral, embora não fosse ética.
Em alguns momentos, ética e moral podem se encontrar, como
por exemplo, na questão de não roubar outra pessoa. Mas na grande maioria das
vezes, são coisas muito distintas.
Um exemplo: uma professora que joga lixo no chão está sendo
anti-ética. Seu comportamento pode ser imitado pelos alunos e jogar lixo no
chão prejudica toda a comunidade. Mas dificilmente alguém diria que a atitude
da professora foi imoral.
Por outro lado, para muitas pessoas a tatuagem é considerada
imoral, portanto um professor que tem tatuagens é imoral, enquanto que para
outras pode ser algo absolutamente normal.
Ao dizer que estão proibidas a
"VEICULAÇÃO DE CONTEÚDOS OU A REALIZAÇÃO DE ATIVIDADES QUE POSSAM ESTAR EM
CONFLITO COM AS CONVICÇÕES RELIGIOSAS OU MORAIS DOS PAIS OU RESPONSÁVEIS PELOS
ESTUDANTES" a lei deixa para o pessoal e subjetivo a decisão sobre o que é
aceitável ou não em sala de aula.
Para o professor que acredita na teoria da terra plana, o professor de geografia que ensina que a terra é arredondada está indo contra suas convicções morais.
Para o pai evangélico, o professor de biologia que ensina a teoria da evolução para as crianças está indo contra suas convicções morais.
Em outras palavras: a lei estimula todo tipo de denúncia.
Pior: pela lei isso deverá ser afixado na frente de todas as portas de aula.
Políticos são espertos: eles sabem que isso vai estimular ainda mais as
denúncias num leque extremamente amplo de atividades ou conteúdos que possam
estar contra a moralidade deste ou daquele indivíduo.
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