Tenho visto muitos pretendentes a roteiristas que leem só
quadrinhos. Pior: leem apenas um tipo de quadrinho, como mangá ou super-heróis.
Nunca conheci um roteirista que não fosse um leitor voraz.
Quando visitei o estúdio Maurício de Sousa Produções, espantei-me com a
biblioteca e com a enorme variedade de livros: filosofia, geografia, romances,
poesia. Para o leigo pode parecer desnecessário ler filosofia para escrever uma
história da Turma da Mônica, mas os mais antenados devem se lembrar da mais
antológica história do Piteco, toda elaborada a partir do mito da caverna, de
Platão.
Nas oficinas de roteiro que eu ministrava, costumava levar
dezenas de quadrinhos dos mais variados tipos para que os alunos conhecessem.
Cada dia uma leva diferente. Um roteirista deve conhecer e ler de tudo, deve
ter seus horizontes ampliados, especialmente se não quiser se transformar numa
simples cópia deste ou daquele autor.
A minha própria formação passou pelos quatro cantos do
mundo. Minha primeira influência foram os britânicos, como Alan Moore, Neil
Gaiman e Grant Morrison. Mas aprendi muita coisa com o franco-belga Charlier
(roteirista do faroeste Blueberry), um mestre absoluto do suspense e da
capacidade de colocar seus protagonistas em situações limite das quais eles
eram capazes de sair de maneira absolutamente verossímil. O japonês Kazuo Koike
(Lobo Solitário) e o argentino Héctor Oesterheld (O Eternauta) são outros
roteiristas que me influenciaram. Ou seja: minha formação quadrinística passou
por vários países e linguagem.
Mas também tive influência de uma penca de escritores, de
George Orwell a Monteiro Lobato, passando por Edgar Allan Poe, Ray Bradbury
(toda a sequência final da graphic Manticore foi uma homenagem ao estilo de
Bradbury) e muitos outros.
Mesmo o festejado Alan Moore teve forte influência
literária. A estratégia de contar uma história a partir de vários pontos de
vista (usada por ele em Monstro do Pântano) foi, segundo ele mesmo, copiada de
Gabriel Garcia Marques. A narrativa que chamo de mosaico, usada por Moore
também no Monstro do Pântano, de mostrar vários fatos específicos para mostrar
o impacto de algo grande veio direto de Charles Dickens.
Ou seja: um roteirista deve ter como princípio básico ler.
Ler de tudo. Ler sempre. E ler cada vez mais.
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