Algo que tenho percebido é a incapacidade da maior parte dos
leitores de quadrinhos de perceber as qualidades de um texto de quadrinhos. Eles
sabem que o texto está lá, mas é como se ele ficasse apenas de maneira
subliminar, não se tornando consciente a ponto de chamar a atenção do leitor –
ao contrário do desenho, cujos méritos são evidentes para a maioria dos
leitores.
Essa percepção ocorre principalmente quando faço críticas à
qualidade do texto de Jack Kirby – e isso já aconteceu vezes o suficiente para
me permitir identificar um padrão.
As críticas à qualidade do texto de Jack Kirby são
geralmente respondidas com: “Mas o desenho dele é lindo”; “Mas a perspectiva
dele era inovadora”; “Mas o traço dele era extremamente dinâmico”; “Mas as histórias
eram geniais”. Ou seja: críticas ao texto são compreendidas como críticas ao
enredo, à narrativa gráfica ou ao desenho.
Com muita dificuldade, às vezes consigo convencer alguém que
estou falando das “letrinhas dentro dos balões”, o que geralmente leva a
respostas do tipo: “Mas o Kirby não podia colocar mais texto nos balões, senão
ficaria chato”. A crítica à qualidade do texto é entendida como uma crítica à
quantidade de texto.
Ou seja: mesmo quando a pessoa consegue tomar consciência de
que há texto de balões, essa consciência diz respeito muito mais à quantidade
de texto do que à qualidade de texto.
Uma possível comparação seria quanto à música, quando a voz
de um interprete se torna marcante demais e os ouvintes não conseguem perceber
conscientemente que há um acompanhamento musical. Da mesma forma, para o leitor de quadrinhos médio,
o desenho é tão marcante que torna o texto invisível. O texto está ali, a pessoa
lê (da mesma forma que um ouvinte ouve o acompanhamento musical), mas não
consegue tomar consciência da existência desse texto.
Para exemplificar que qualidade não tem relação nenhuma com
quantidade, deixo uma história de Spirit, de Will Eisner. O texto da última página
é mínimo, mas de uma poesia impressionante – aliás, essa é apontada por muitos
como a melhor história de Spirit de todos os tempos.
Em tempo: para entender minhas críticas ao texto de Jack
Kirby, uma boa dica é este texto sobre Etrigan.
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