Toda a água consumida pela capital paraense vem de um lago, o lago do Utinga. Para que a água fosse preservada, criou-se uma reserva, de modo que Belém é talvez a única cidade do Brasil que tem, dentro dela, uma floresta nativa. Hoje em dia o Utinga se tornou um parque, onde podem ser realizadas atividades físicas como corridas e pedais e onde se localizam cafés turísticos. Mas na época, a área era apenas mato. Nós costumávamos passar o final de semana lá, às vezes só o sábado, às vezes só o domingo, às vezes sábado e domingo. Ficávamos andando pela floresta, ou simplesmente tomando banho no lago.
No Utinga vimos muita coisa, muitas inexplicáveis.
Era comum entrarmos em horários diferentes, já que todo mundo vinha de ônibus diversos. Assim, quem entrava, ficava esperando os outros em um ponto com uma pequena cabana feita por nós, que carinhosamente apelidávamos de Estação Capela. Eu normalmente era o primeiro a chegar e ficava atento, esperando a chegada dos outros. Nisso, constantemente via alguém se aproximando no meio da mata. A pessoa passava atrás de uma árvore e... sumia. Não aparecia do outro lado! Certa vez andávamos em fila indiana e o Marco viu, passando no meio da floresta e sumindo atrás de um tronco caído, um ser totalmente preto, com folhas envoltas no corpo.
Alguns perigos eram menos misteriosos, mas nem por isso menos assustadores. Era comum usarmos troncos de árvores para atravessarmos distâncias maiores. Subíamos no tronco, colocando uma perna de cada lado, como se montávamos um cavalo e íamos remando com as mãos. Certa vez, o meu tronco enroscou em alguma coisa, fazendo com que eu ficasse totalmente paralisado. Enquanto eu tentava me desvencilhar, uma cobra surgiu exatamente na minha frente. Ela se elevou ficando cara a cara comigo. Foram momentos tensos, nos quais eu não ousava me mexer. Depois de um tempo que me pareceu uma eternidade, ela mergulhou e desapareceu.
Havia uma lenda, contada entre os frequentadores do local, de que existia uma cobra grande na lagoa. Segundo essa lenda, um rapaz que estava tomando banho em uma das pequenas praias que se formaram no local tinha sido puxado para dentro do rio por algo. Ele se debatia, tentando escapar, mas o que o arrastava devia ser muito mais forte.
(Trecho do meu livro A árvore das ideias - clique aqui para baixar)
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