domingo, maio 14, 2006

Por que o livro é tão caro?

Pense rápido: nessa época da "arte e reprodutibilidade técnica" - como diria Walter Benjamin - qual produto cultural se manteve praticamente imune aos flagelos da pirataria?

Com certeza não foi o produto da indústria fonográfica - o disco.

E com certeza não foi o produto da indústria cinematográfica - os filme.

Muito menos é o produto da indústria de games eletrônicos - ainda que se pese o fato de ser discutível se os games são cultura ou não - mas com certeza são entretenimento (bom ou mau).

Em qualquer lugar do mundo é possível encontrar camelôs vendendo cd´s, cd-rom´s e dvd´s a um preço cada vez menor, além do que as próprias músicas e filmes podem ser baixados facilmente pela internet em diversos formatos de arquivos. Se isto é um mal que corta milhares de empregos e provoca falências e alimenta o poder do crime organizado ou se é um bem que traz em seu bojo a possibilidade de todos terem acesso barato à cultura e entretenimento, não é mérito deste texto discutir. O ponto de discussão aqui é o seguinte: se o único produto cultural que escapou da crise que ocorre em outras mídias foi o livro, por que ele é tão caro?

Esta questão da pirataria é por que as indústrias fonográficas e cinematográficas dizem que seus produtos são caros devido ao fato de terem de repassar o prejuízo gerado pela pirataria (tal argumento foi satirizado de maneira muito engraçada num número da revista Mad, onde um destes empresários lamenta que, graças à pirataria, ele teve que aumentar o preço de discos de artistas muito "criativos" como É o Tchan e Bonde do Tigrão, e diminuir o seu suprimento de drogas de consumo pessoal em 20 por cento...). Com exceção de algumas localidades da Ásia, onde ocorrem realmente edições piratas dos livros convencionais, as editoras do mundo inteiro passaram longe de toda essa problemática moderna. De fato, não vemos camelôs vendendo livros impressos pirateados. Não há nada parecido que ameace as editoras, e muito menos as editoras nacionais - toda a gritaria e choradeira dos editores nacionais contra as cópia do tipo "xerox" não têm razão nenhuma de ser, na medida mesma em que geralmente quem recorre a esse recurso são estudantes que fazem cópias para si próprios com intuito de estudar e não para sair vendendo por aí, pois o próprio custo do xerox tornaria tal operação proibitiva em larga escala - além do que seria operacionalmente absurdo um camelô tentar vender cópias em xerox de livros, pois o próprio peso destas apostilas dificultaria sua fuga da fiscalização, dentre outras coisas (e também apostilas xerox não seriam algo de apelo popular de venda, certamente). E nenhum estudante recorre a xerocar livros por querer; pois ao contrário das cópias dos discos e filmes que são muitas vezes idênticas em qualidade dos discos e filmes originais, uma apostila xerocopiada de livro é em geral muito ruim. O estudante parte para esta solução principalmente devido ao preço do livro comprado "zero quilômetro" nas livrarias. Livros de cem, duzentos, trezentos reais.

Reitera-se então a pergunta: estando o mercado editorial nacional incólume ao tipo de pirataria verificado em outras mídias, então por que o livro no Brasil é tão caro? O que justifica preços tão estorsivos? Por que um trabalho de domínio público como a Metafísica de Aristóteles sai por cerca de quatrocentos e quinze reais?? Isto de ser caro se deve pelos impostos e pelas matérias-primas (celulose e etc)? então por que os editores nunca se reuniram para pressionar vigorosamente o governo para abaixar os impostos dessa área considerada estratégica por qualquer país decente? Um livro de, digamos 50 reais... qual o impacto deste valor para o salário médio do trabalhador brasileiro? Com certeza é muito elevado - é bem verdade que os editores não têm culpa do brasileiro ganhar mal, mas támbém os brasileiros não têm culpa dos livros serem caros. Pode-se alegar que o brasileiro poderia ir numa biblioteca pública, mas é fato que as bibliotecas não fazem milagres, elas não têm todos os livros, apesar de em geral possuírem livros bons e necessários. Restam ainda os chamados sebos, mas estes passam por uma transformação no mínimo peculiar. Antigamente o sebo era o lugar onde se comprava livros usados a preços camaradas. Agora, talvez percebendo - como as editoras e livrarias "oficiais" - que o livro é um excelente negócio, os donos de sebos acham que seus produtos empoeirados não são livros "sebosos"; são antes "raridades", que eles vendem sem absolutamente nenhuma diferença de preço dos livros encontrados nas livrarias de shopping center. E muito pelo contrário! O autor deste artigo passou pela experiência de ir num sebo atrás de um livro que, comprado novo, custa cerca de trinta reais; mas lá no bendito sebo, o mesmíssimo livro, da mesmíssima edição, estava por cerca de NOVENTA REAIS!...

A história nos mostra que o sistema capitalista só reage em benefício das pessoas quando ameaçado de morte. Foi assim no final do século XIX na Europa, quando os novos movimentos sociais como o comunismo e o anarquismo ameaçavam tocar fogo em todo mundo conhecido que os senhores capitalistas resolveram diminuir as horas diárias de trabalho dos assalariados para algo um pouco abaixo das QUATORZE HORAS DIÁRIAS (tal drama pode ser conferido no livro "Germinal" do francê Émile Zollá). Com certeza este absurdo das editoras nacionais só poderia ser combatido se as mesmas fossem ameaçadas. E a maior ameaça ao produto delas, que é o livro convencional, seria a cópia deste compartilhado livremente pela internet. Seria o livro eletrônico.

Vejamos um pouco sobre as qualidades dos livros eletrônicos:
- O livro eletrônico evita o corte de árvores, já que ele dispensa o uso do papel;
- O livro eletrônico não ocupa espaço físico, podendo bibliotecas inteiras serem armazenadas num computador de mão do tipo "Palm" ou "Pocket Pc" e serem transportadas e acessadas quando a pessoa quiser;
- A maioria dos livros de domínio público estão em bibliotecas virtuais para o acesso gratuito do leitor (bibliotecas virtuais costumam ser sites em que esses livros são disponibilizados em formatos de arquivos eletrônicos, como o .PDF). Mas não só obras de domínio público – e aqui entra uma grande e poderosa vantagem do livro eletrônico – mas também de autores iniciantes são disponibilizadas em várias bibliotecas virtuais. O livro eletrônico contribui decisivamente para que o público tenha acesso a obras literárias que costumam ser ignoradas pelas editoras convencionais.
O conceito de livro eletrônico apareceu ao grande público mais ou menos no mesmo período em que o formato de música .mp3, no final do século vinte. Infelizmente, porém, o chamado "e-book" nunca atingiu a popularidade do mp3. O e-book nunca ameaçou o mercado editorial de livros de papel como o mp3 fez com a indústria fonográfica. Todo mundo baixa mp3, mas quase ninguém lê e-book. Fatores para isso é o que não faltam, entre eles a necessidade psicológica do leitor de segurar um livro de papel para considerá-lo como tal e também o fato da melhor maneira de se ler um livro eletrônico confortavelmente é através de dispositivos portáteis como computadores de mão, que ainda são muito caros. Mas aos poucos esses aparelhos estão barateando, e logo ficarão tão baratos quanto um walkman. Quando isso acontecer, o binômio computador de mão/livro eletrônico será um dos principais instrumentos de leitura de textos do futuro próximo, em que veremos estudantes lendo atentamente em seus palms alguns dos livros que irão cair no vestibular, e enquanto lêem, ouvem através de fones algumas músicas armazenadas no mesmo computador de mão. Mídias diferentes coexistindo pacificamente.

Mas é bom salientar que mesmo dispositivos como o palm são apenas paliativos, pois suas telas são muito pequenas para serem usadas para leitura de livros eletrônicos. O ideal é um dispositivo um pouco maior chamado "ebook reader device". A tela dessa categoria de aparelho é em do tamanho de uma página de livro, o que resulta numa leitura muito mais confortável, além do que eles possuem diversos recursos específicos voltados para o livro eletrônico, como por exemplo marcador de página, tradutor, dicionário, etc. Um exemplo de ebook reader device pode ser conferido neste link: http://www.ebookwise.com/ . Mas a venda deste modelo se limita ao mercado norte-americano e canadense.

Não há absolutamente nenhum dispositivo destes à venda no Brasil. E, a julgar pelas editoras, eles nunca estarão à venda. Certamente os editores têm calafrios quando ouvem falar de camelôs vendendo cd´s de livros eletrônicos dos seus queridos autores na praça da República em São Paulo. Eles preferem virar a cara no travesseiro e dormir o sono dos justos, sonhando talvez com lucros que, trocadilho à parte, não estão escritos.

escrito por
Josiel Vieira de Araújo
em 13 de maio de 2006

1 comentário:

Unknown disse...

Já está disponível o primeiro leitor de livro eletrônicos no Brasil. Pode ser adquirido através do site ebookreader.com.br.

Duvido muito que lojas como a Americanas.com ou Submarino.com divulguem um aparelho como este, pois estas lojas lucram muito com a distribuição de livros.