Entre as
várias teorias que tentaram explicar a influência da mídia sobre a sociedade,
uma das mais conhecidas é a teoria hipodérmica, segundo a qual os meios de
comunicação seriam como uma agulha, injetando seus conteúdos em uma massa
amorfa e atomizada.
O livro Admirável mundo novo mostra um mundo perfeitamente ordenado em que
as pessoas são organizadas por castas e vivem felizes e massificadas, exercendo
funções definidas e jamais se rebelando graças a um processo de condicionamento
que usa, entre outros elementos, a mídia.
Na história, bebês dormem
ouvindo um sistema de som que repete continuamente o “Curso elementar de
consciência de classe”: “As
crianças Alfa vestem roupas cinzentas. Elas trabalham mais do que nós porque
são formidavelmente inteligentes. Francamente, estou contentíssimo de ser um
Beta, porque não trabalho tanto. E, além disso, somos muito superiores aos Gama
e Delta. Os Gama são broncos. Eles se vestem de verde e as crianças Delta de
cáqui. Oh, não, não quero brincar com as crianças Deltas. E os Ípisilons são
ainda piores. São demasiado broncos para saberem ler e escrever. Como sou feliz
por ser um Beta”.
As crianças ouviam isso
dezenas de vezes enquanto dormiam. O objetivo era moldar a personalidade das
mesmas.
Na distopia imaginada por
Huxley as pessoas não têm pensamentos verdadeiros. Eles se sentem felizes por
que foram condicionados pelos meios de comunicação a se sentirem felizes.
A influência da hipótese
hipodérmica fica ainda mais clara em 1984,
de George Orwell. No livro, escrito em 1948 (o título é apenas uma inversão da
data), as pessoas são vigiadas 24 horas por dia através de teletelas, aparelhos
capazes de enviar e receber imagens. Cartazes enormes, com a foto do Big
Brother e os dizeres: “O grande irmão zela por ti”, são espalhados por todos os
cantos e os olhos do ditador, enormes, parecem vigiar a todos.
Não é nem mesmo necessário
cometer qualquer crime contra o regime para ser preso e torturado. O simples
pensamento incorreto já é uma transgressão. Para evitar que se tenha
pensamentos errados, até a linguagem é manipulada.
Nos dizeres de um dos
personagens: “A
revolução se completará quando a língua for perfeita. Novilíngua é Ingsoc, e
Ingsoc é Novilíngua (...) como será possível dizer “liberdade é escravidão, se
for abolido o conceito de liberdade? Todo mecanismo de pensamento será
diferente. Com efeito, não haverá pensamento, como hoje o entendemos. Ortodoxia
quer dizer não pensar... não precisar pensar. Ortodoxia é inconsciência”.
O partido, através da mídia
controla não só o presente, mas também o passado, continuamente reescrito para
se adequar às diretrizes do partido.
Exemplo disso é a questão do
chocolate. No início do livro, um pronunciamento do Ministro da Fartura diz que
a ração de chocolate será reduzida de 30 para 20 gramas. No final do livro, a
mídia diz que a ração está sendo aumentada para 20 gramas e, numa perfeita
demonstração dos princípios da teoria hipodérmica, a população vai às ruas
comemorar o suposto aumento.
O episódio mostra um poder
absoluto da mídia sobre o pensamento dos indivíduos, vistos como atomizados e
submissos. A massa acredita em qualquer
coisa que a teletela informa, por mais absurda ou paradoxal que seja.
O Partido não só cria e
manipula a massa, como ainda controla, através dos meios de comunicação, um
outro tipo de comportamento coletivo: a multidão. Controlados inclusive
sexualmente, os cidadãos da Oceania descarregam sua revolta nos “Dois minutos
de ódio”, em que o alvo é sempre o inimigo do estado, Goldstein, cuja imagem é
exposta em uma teletela. Associado ao inimigo contra o qual a Oceania está em
guerra, Goldstein torna-se vítima de todas as frustrações dos indivíduos.
Os dois minutos de ódio ecoam
as demonstrações de apoio popular dos regimes totalitários, como os do nazismo e o stalinismo.
Outro livro fundamental é Fahrenheit 451, de Ray Bradbury. Nele,
são as próprias pessoas que se tornam massa espontaneamente ao fugirem de
qualquer coisa que possa incomodá-los. Daí a proibição de livros, que podem
interferir na felicidade da massa.
Em Fahrenheit 451, as pessoas evitam a todo custo qualquer atividade
isolada ou reflexiva. Gastam todo o tempo que não estão trabalhando em esportes
ou dentro de carros, correndo como loucas pelas auto-estradas, ou na frente da
televisão com personagens que são chamados de “a família”. Na falta de vínculos
reais, a família passa a ser a que está dentro da TV. Brabury chama as pessoas
embrutecidas pela televisão de “mulheres de palha”.
A mídia é como uma droga, que
hipnotizava as pessoas e as deixava dependentes, emburrecidas. Em determinado
momento, no metrô, toca um anúncio de creme dental. As pessoas não conseguem
resistir e acompanham o jingle com batidas de pés, as bocas agitando levemente
e repetindo o slogan.
O personagem principal é
Montang, um bombeiro, mas, uma vez que as casas são revestidas de plástico
resistente ao fogo, sua função é queimar livros. Sua vida muda quando encontra
com uma garota que lhe pergunta se ele é feliz, o que o leva a uma reflexão
crítica sobre sua vida: “Não estava feliz. Não estava feliz. Disse as palavras
para si mesmo. Admitiu que este era o verdadeiro estado das coisas. Usava sua
felicidade como uma máscara e a garota fugira com ela pelo gramado (...)”.
A partir dessa reflexão, ele
se interessa por livros e, a partir daí, torna-se um perigo para o sistema. Ao
sistema não interessa pessoas que pensem por si mesmas, que sejam público. Daí
porque Montang passa a ser perseguido.
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