quinta-feira, dezembro 31, 2020

Blueberry: o melhor faroeste franco-belga

 

 
     O faroeste sempre foi um gênero popular na Europa, com vários personagens e vários tipos de abordagens. Mas, no meio de tantos heróis, um se destacou e se tornou um verdadeiro clássico: trata-se de Blueberry, criação do roteirista Jean-Michel Charlier em dupla com o desenhista Jean Giraud, que posteriormente viria a assinar Moebius.
     Blueberry revolucionou ao mostrar um personagem que foge completamente do estereótipo do cowboy clássico: ele é um beberrão, jogador inveterado e indisciplinado. Em outra palavras: um anti-herói. Além disso, constantemente, Blueberry toma partido em favor do índios, uma novidade total, já que até então, com raras exceções, os índios eram mostrados como vilões.
     Além disso, as histórias de Blueberry mostravam um personagem que evoluía e se tornava mais experiente com o tempo. Aliás, essa cronologia era mostrada de forma não-linear, pois a juventude do personagem só foi contada depois que ele já era famoso.
     Jean-Michel Charlier, o roteirista, é uma verdadeira lenda nos quadrinhos franco-belgas. Aos 23 anos ele abandonou o curso de Direito para se dedicar aos quadrinhos. Começou escrevendo aventuras do aviador americano Buck Danny para a revista Spirou, em parceria com o também belga Victor Hubinon. Em 1959, junto com René Goscinny e Albert Uderzo, fundou a revista Pilote, posteriormente comprada pela editora Dargaud. Para o traço de Uderzo, criou os aviadores Tangui e Laverdure. Para Hubinon criou a série juvenil Barba Ruiva, sobre um garoto filho do famoso pirata.
     Jean-Giraud é, talvez, o desenhista europeu mais famoso de todos os tempos. Ele começou sua carreira como assistente de Jijé, criador do cowboy Jerry Spring. Seu primeiro trabalho importante foi justamente o tenente Blueberry. Inicialmente imitando Jijé, ele foi aos poucos criando um traço próprio, extremamente detalhista e original. Mas mesmo nas pranchas iniciais de Blueberry já é possível perceber que ele tinha um talento incomparável. Seu detalhismo chegava ao ponto de, ao desenhar um saloon, colocar dezenas de pessoas em posições diferentes. Na década de 1970, Jean-Giroud mudou seu nome para Moebius, juntou-se com outros desenhistas e roteiristas e revolucionou os quadrinhos franceses com histórias surrealistas de ficção-científica e fantasia para a revista Metal Pesado.
     A junção desses dois mestres não poderia resultar em algo que não fosse uma obra-prima. Embora outros cowboys (como tex) possam ser mais famosos, Blueberry é considerado pela maioria dos críticos como o ponto alto do gênero (honra que é disputada apenas com o quadrinho italiano Ken Parker).
     Charlier fez uma verdadeira investigação sobre a época, retratando de maneira muito detalhista o cotidiano do velho oeste. Além disso, ele introduziu fatos e personagens reais em sua história, num recurso característico da pós-modernidade que seria imitado posteriormente por outros autores.
     Se por um lado, Charlier teve uma grande preocupação histórica, ele também não descuidou da aventura. Como as aventuras de Blueberry eram publicada em seminários antes de serem juntadas num álbum, o roteirista colocava um gancho de suspense no final de cada página, deixando o leitor curioso para ler o resto. Essa técnica virou quase que um padrão no quadrinho europeu.

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