quinta-feira, janeiro 13, 2022

Contos de fantasmas, de Charles Dickens

 

Charles Dickens é mais conhecido pelo Conto de Natal, na qual um homem avarento é visitado por três fantasmas, que lhe mostram o passado, o presente e o futuro. Mas essa não é sua única história envolvendo espíritos como mostra o volume Contos de fantasmas sem natal, da editora Nova Alexandria, lançado em 2019.

O interesse de Dickens pelo assunto vinha da infância. Nessa época ele teve uma babá que era uma fantástica contadora de histórias e tinha gosto particular por histórias de fantasmas. Quando esta deixou a família, o futuro escritor passou a colecionar uma revista chamada The Terrific Register, especializada em contos de terror e mistério. O interesse continuou na vida adulta a ponto dele ter sido um dos primeiros membros do The Ghost Club, de Londres, uma sociedade dedicada ao estudo de fenômenos sobrenaturais. E, claro, passou esse interesse para suas narrativas.

O livro reúne sete contos que incluem fantasmas.

“Manuscrito de um louco” lembra demais as histórias de Edgar Alan Poe e conta a história de um homem que mata a esposa e acaba sendo denunciado por circunstâncias totalmente fortuitas (ou talvez sobrenaturais, a narrativa não deixa isso claro). É a narrativa menos Dickens do livro e também a que parece ter menos relação com o tema do livro.

Já o “Barão de Grogzwig” é Dickens puro, em especial no refinado humor e ironia inteligente. Na história, um Barão resolve se suicidar, mas acaba desistindo graças à intervenção do Espírito do suicídio. O texto já revela as melhores qualidades do autor desde a primeira frase: “O Barão Von Koeldwethout, na Alemanha, era um jovem barão tão típico quanto se deseja ver. Não preciso dizer que vivia num castelo, porque é óbvio; tampouco que ele vivia num castelo antigo, pois que barão germânico alguma vez viveu num castelo novo?”. Lá na frente diz: “Não cabe a mim dizer por que meios, ou em que graus, algumas esposas conseguem manter seus maridos sob controle como o fazem, embora possa ter minha opinião privada sobre o assunto”.

“Confissão encontrada em uma cela na época do rei Charles II” é outra narrativa que lembra muito Poe – e apresenta o mergulho na mente de um assassino. Mas, como na primeira histórias, os fantasmas podem ser apenas o reflexo de uma mente enlouquecida.

“Quatro histórias de fantasmas” são narrativas mais convencionais, “causos” ouvidos por Dickens e transpostos para uma revista. Tanto que um deles, sobre um pintor de retratos, levou o protagonista a escrever para a revista para contar sua própria versão dos fatos (o relato também está incluso no livro).

Terror mesmo são as duas últimas histórias do livro, em especial “Julgamento por assassinato”. Na trama, um homem que fará parte de um tribunal do júri descobre que pode ver o espírito da vítima e passa todo o julgamento observado como o fantasma tenta a todo custo conseguir a condenação de seu assassino, seja induzindo sonhos nos outros jurados seja fazendo-os observar com mais atenção determinados detalhes. É uma narrativa tensa, em que o sobrenatural aflora com força.

Já “O homem do sinal” traz o encontro do autor com um homem que cuida da sinalização dos trens em um cruzamento. É uma narrativa tensa, em que sabemos que algo terrível irá acontecer ou que há algo sobrenatural acontecendo. Até que o terror irrompe, no último parágrafo. É um ótimo exemplo de como Dickens sabia construir o suspense a serviço de uma história sobrenatural.

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