A louca do sagrado coração, álbum com roteiro de Jodorowsky e desenhos de Moebius, lançado em 2019 pela Veneta, é um daqueles exemplos de HQs que nos surpreendem positivamente.
A história parece apenas uma crítica ácida ao academicismo. Mangel
é um professor da Sorbone que carrega ao redor de si uma legião de fãs tão
inveterados que todos eles usam roxo, como o mestre, em sinal de concordância com
ele.
Mas, se é uma figura eminente, é também um desastre em sua
vida pessoal. Sua esposa o troca por outro, depois de oito anos sem atividade
sexual, uma vez que ele se transformou em um “monge universitário”. Dono de um
controle emocional lendário, ele não sai do sério nem mesmo quando alguns
alunos colocam uma réplica de um cervo, com galhos enormes (em referência ao
chifre levado por ele). Como sempre, ele responde com citações dos mais
diversos filósofos.
Uma das alunas engravida do filósofo acreditando que irá gerar o novo profeta João. |
Essa trama, levemente divertida, com alguns toques de erotimo,
não parece sustentar um álbum e de fato não sustenta. A trama começa de fato
quando uma aluna decide que ele é a reencarnação do profeta Zacarias, e que
deve gerar um novo João Batista. Pior: depois de grávida, ela tem uma visão que
coloca um traficante de heroína como o novo São José e a filha de um líder de
um cartel de drogas como a Maria que irá gerar o novo Jesus (a nova “Maria” está
internada num hospício).
A história foi publicada originalmente em cores.
Nesse ponto a trama, que parecia lenta, desinteressante e
arrastada, torna-se um turbilhão, com reviravoltas se sobrepondo a
reviravoltas. Reviravoltas quase surreais, mas que fazem sentido dentro da
trama. Nesse ponto é impossível largar a leitura.
Jodorowsky mistura essa trama non-sense isso com crítica social, crítica política,
psicologia junguiana e sua visão mística do mundo.
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