terça-feira, março 29, 2022

Dissonância cognitiva

 


Em 1954 a paranormal norte-americana Dorothy Martin revelou que tinha sido alertada por extraterrestre que o mundo seria destruído. Segundo ele, à meia noite do dia 20 de dezembro, um alienígena surgiria para salvar seus discípulos. Todo o resto da humanidade seria extinto.
Mas quando deu meia-noite, nada aconteceu. Não surgiu nenhum extraterrestre salvador e a humanidade não pereceu. 
Dorothy Martin previu o fim do mundo
Dois psicólogos que haviam se infiltrado no grupo ficaram curiosos para saber o que aconteceria a seguir. Afinal, havia uma evidência inconstestável de que a profecia era apenas uma mentira bem contada. Era inevitável que deixassem de acreditar na paranormal. Entretanto, o que aconteceu foi exatamente o contrário. A médium anunciou que o fim do mundo havia sido cancelado por causa das orações de seus seguidores.
O grupo ficou em êxtase. Eles tinham salvo o mundo. Alguns seguidores começaram a ligar para a imprensa para anunciar a novidade.
Um dos psicólogos presentes ao evento, Leon Festinger, chamou esse fenômeno de dissonância cognitiva: quando os fatos contradizem aquilo que acreditamos, mudamos os fatos para adequá-los às nossas crenças. E não só isso: também ignoramos qualquer fato que contradiga essa crença.
Bom exemplo desse processo de adaptar à realidade às crenças tem ocorrido com relação à pandemia de coronavírus.
No dia 10 de março, o presidente do Brasil, em viagem aos EUA, afirmou em entrevista coletiva que o coronavírus não era tudo isso e que a pandemia era fantasia criada pela mídia (posteriormente ele diria que era só uma gripezinha).
Como resultado milhões de pessoas passaram a acreditar que a doença (que nessa época já estava fazendo vítimas na Itália) não oferecia risco nenhum. Era só uma gripezinha que, provavelmente nunca chegaria ao Brasil.
Quando a doença já estava instalada no Brasil e já havia até mortes, o discurso mudou, mas era de novo uma alteração nos fatos para adequá-los às crenças. Agora pegava-se as mortes durante todo um ano de H1N1 e comparava-se com as mortes de uma semana de coronavírus para argumentar que a H1N1 matava mais.
Depois, quando o número de mortes diárias se tornou grande demais para esconder, começaram a dizer que o ministério da saúde tinha orientado para que toda e qualquer morte fosse creditada como sendo provocada pelo coronavírus (por mais contraditório que isso seja, uma vez que o ministério da saúde é do governo federal).
Depois, como era necessário exemplificar essa versão, passaram a dizer que o primo do porteiro do prédio morreu trocando um pneu e foi diagnosticado com coronavírus. De repente, em um único dia milhares de primos de proteiros de prédio foram assassinados por pneus. 
Quando começaram a surgir vacinas, o discurso oficial do presidente e do gabinete do ódio é de que as vacinas matavam, provocavam sequelas, implantavam chips, transformavam em jacarés. Parecia que todas os males do mundo eram provocados por vacinas. Depois, quando ficou claro que a única solução para o retorno à normalidade seria a vacina, o discurso passou a ser de que o presidente sempre fora a favor da vacina e que fizeram tudo o possível para consegui-la. 
E, a cada nova versão, as pessoas acreditavam, por maior que fosse a contradição entre as várias versões. Dissonância congnitiva. 

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